sábado, 22 de fevereiro de 2014

A Obediência de Caim e Abel

Caim e Abel, filhos de Adão, diferiam grandemente em caráter. Abel tinha um espírito de fidelidade para com Deus; via justiça e misericórdia nos cuidados que o Criador tinha com a raça decaída, e com gratidão aceitou a esperança da redenção. Caim, porém, acariciava sentimentos de rebeldia, murmurava contra Deus por causa da maldição pronunciada sobre a Terra e sobre o gênero humano em virtude do pecado de Adão. Permitiu que a mente se deixasse levar pelo mesmo conduto que determinara a queda de Satanás, condescendendo com o desejo de exaltação própria, pondo em dúvida a justiça e autoridade divinas.

Esses irmãos foram provados, assim como foi Adão antes deles, para mostrar se confiariam na Palavra de Deus e obedeceriam à mesma. Estavam cientes da providência tomada para a salvação do homem, e compreendiam o sistema de ofertas que Deus ordenara. Sabiam que nessas ofertas deveriam exprimir fé no Salvador a quem tais ofertas tipificavam, e ao mesmo tempo reconhecer a sua total dependência dEle, para o perdão; e sabiam que, conformando-se assim ao plano divino para a sua redenção, estavam a dar prova de sua obediência à vontade de Deus. (...)


Os dois irmãos de modo semelhante construíram seus altares, e cada qual trouxe uma oferta. Abel apresentou um sacrifício do rebanho, de acordo com as instruções do Senhor. "E atentou o Senhor para Abel e para a sua oferta." (Gênesis 4:4 KJV). Lampejou fogo do Céu, e consumiu o sacrifício. Mas Caim, desrespeitando o mandado direto e explícito do Senhor, apresentou apenas uma oferta de frutos. Não houve sinal do Céu para mostrar que era aceita. Abel instou com seu irmão para aproximar-se de Deus da maneira divinamente prescrita; mas seus rogos apenas tornaram Caim mais decidido a seguir sua própria vontade. Sendo mais velho, achava que não lhe condizia ser aconselhado por seu irmão, e desprezou o seu conselho.

Caim veio perante Deus com íntima murmuração e incredulidade, com respeito ao sacrifício prometido e necessidade de ofertas sacrificais. Sua dádiva não exprimia arrependimento de pecado. Achava, como muitos agora, que seria um reconhecimento de fraqueza seguir exatamente o plano indicado por Deus. (...) Quanto ao nascimento e instrução religiosa, esses irmãos eram iguais. Ambos eram pecadores e ambos reconheciam o direito de Deus à reverência e adoração. Segundo a aparência exterior, sua religião era a mesma até certo ponto; mas, além disto, a diferença entre os dois era grande.

"Pela fé Abel ofereceu a Deus maior sacrifício do que Caim." (Hebreus 11:4 KJV). Abel apreendeu os grandes princípios da redenção. Viu-se como um pecador, e viu o pecado e sua pena de morte entre sua alma e a comunhão com Deus. Trazia morta a vítima, aquela vida sacrificada, reconhecendo assim as reivindicações da lei, que fora transgredida. Por meio do sangue derramado olhava para o futuro sacrifício, Cristo a morrer na cruz do Calvário; e, confiando na expiação que ali seria feita, tinha o testemunho de que era justo, e de que sua oferta era aceita. Caim tivera, como Abel, a oportunidade de saber e aceitar estas verdades. Não foi vítima de um intuito arbitrário. Um irmão não fora eleito para ser aceito por Deus, e o outro para ser rejeitado. Abel escolheu a fé e a obediência; Caim, a incredulidade e a rebeldia. Nisto consistia toda a questão. (...)

A verdadeira fé, que confia inteiramente em Cristo, manifestar-se-á pela obediência a todos os mandamentos de Deus. Desde o tempo de Adão até o presente, o grande conflito tem sido com referência à obediência à lei de Deus. Em todos os séculos houve os que pretendiam ter direito ao favor de Deus, mesmo enquanto estavam a desatender algumas de Suas ordens. Mas as Escrituras declaram que pelas obras a "fé foi aperfeiçoada", e que, sem as obras da obediência, a fé "é morta" (Tiago 2:14-26). Aquele que faz profissão de conhecer a Deus, "e não guarda os Seus mandamentos, é mentiroso, e nele não está a verdade" (I João 2:4 KJV).

Quando Caim viu que sua oferta foi rejeitada, ficou irado com o Senhor e com Abel; ficou irado de que Deus não aceitasse o substituto do homem em lugar do sacrifício divinamente ordenado, e irado com seu irmão por preferir obedecer a Deus a unir-se em rebelião contra Ele. Apesar do descaso de Caim pelo mandado divino, Deus não o deixou entregue a si; mas condescendeu em arrazoar com o homem que tão sem razão se mostrara. E o Senhor disse a Caim: "Por que te iraste? E por que descaiu o teu semblante?" (Gênesis 4:6 KJV). Por meio de um mensageiro angélico foi transmitida a advertência divina: "Se bem fizeres, não haverá aceitação para ti? E, se não fizeres bem, o pecado jaz à tua porta. (...)" (Gênesis 4:7 KJV). A escolha dependia unicamente de Caim. Se confiasse nos méritos do Salvador prometido, e obedecesse às ordens de Deus, desfrutaria de Seu favor. Mas, se persistisse na incredulidade e transgressão, não teria motivos de queixa por ser rejeitado pelo Senhor.

Mas, em vez de reconhecer o seu pecado, Caim continuou a queixar-se da "injustiça" de Deus, e acalentar inveja e ódio a Abel. Rancorosamente censurou seu irmão, e tentou arrastá-lo à controvérsia com respeito ao trato de Deus para com eles. Com mansidão, se bem que destemida e firmemente, Abel defendeu a justiça e bondade de Deus. Indicou o erro de Caim, e procurou convencê-lo de que a falta estava com ele. Acentuou a compaixão de Deus ao poupar a vida de seus pais, quando Ele os poderia ter punido com morte instantânea, e insistiu em que Deus os amava, ou então não haveria dado a Seu Filho, inocente e santo, para sofrer a pena em que eles tinham incorrido. Tudo isto fez com que a ira de Caim mais se acendesse.

A razão e a consciência lhe diziam que Abel tinha razão; mas ele estava enraivecido de que aquele que estivera acostumado a atender seus conselhos pretendesse agora discordar dele, e de que não pudesse ganhar simpatia em sua rebeldia. No furor de seu ódio, matou o irmão.

Caim odiou e matou o irmão, não por qualquer falta que Abel houvesse cometido, mas "porque as suas obras eram más, e as de seu irmão justas." (I João 3:12 KJV). Assim, em todos os tempos os ímpios têm odiado os que eram melhores do que eles. A vida de Abel, de obediência e inabalável fé, era para Caim uma reprovação perpétua. "Todo aquele que faz o mal aborrece a luz, e não vem para a luz, para que suas obras não sejam reprovadas." (João 3:20 KJV cf. Provérbios 28:4). Quanto mais brilhante for a luz celestial que se reflete no caráter dos fiéis servos de Deus, tanto mais claramente se revelam os pecados dos ímpios, e mais decididos serão seus esforços para destruir os que lhes perturbam a paz.

O assassínio de Abel foi o primeiro exemplo da inimizade que Deus declarou que existiria entre a serpente e a semente da mulher - entre Satanás e seus súditos, e Cristo e Seus seguidores. Por meio do pecado do homem, Satanás ganhara domínio sobre a raça humana, mas Cristo a habilitaria a sacudir este jugo. Quando pela fé no Cordeiro de Deus uma alma renuncia o serviço do pecado, acende-se a ira de Satanás(a).

A vida santa de Abel testificava contra a pretensão de Satanás de que é impossível ao homem guardar a lei de Deus. Quando Caim, movido pelo espírito do maligno, viu que não podia dominar Abel, irou-se de tal maneira que lhe destruiu a vida. E onde quer que haja alguém que esteja pela reivindicação da justiça da lei de Deus, o mesmo espírito se manifestará contra ele. É o espírito que através de todos os séculos acendeu a fogueira ardente para os discípulos de Cristo. Essas crueldades amontoadas sobre os seguidores de Jesus são instigadas por Satanás e sua hoste, porque não podem eles obrigá-los a sujeitar-se ao seu domínio. É a cólera de um adversário vencido. Todo o mártir por Jesus morreu como vencedor. Diz o profeta: "Eles o venceram [aquela 'antiga serpente, chamada o diabo, e Satanás'] pelo sangue do Cordeiro e pela palavra do seu testemunho; e não amaram as suas vidas até à morte." (Apocalipse 12:9-11 KJV).

Caim, o homicida, logo foi chamado para responder por seu crime. "E disse o Senhor a Caim: 'Onde está Abel', teu irmão? E ele disse: 'Não sei: sou eu guardador de meu irmão?'" (Gênesis 4:9 KJV). Caim tinha avançado tanto no pecado que perdera a intuição da contínua presença de Deus e de Sua grandeza e onisciência. Assim recorreu à falsidade para esconder a sua culpa.

De novo diz o Senhor a Caim: "Que fizeste? A voz do sangue do teu irmão clama a Mim desde a terra." (Gênesis 4:10 KJV). Deus dera a Caim oportunidade para confessar seu pecado. Tivera tempo para refletir. Compreendera a enormidade da ação que praticara, e da falsidade que proferira para a ocultar; mais ainda, foi rebelde, e a sentença não mais se adiou; a voz divina que tinha sido ouvida em solicitações e admoestações, pronunciou as terríveis palavras: "E agora maldito és tu desde a terra, que abriu a sua boca para receber da tua mão o sangue do teu irmão. Quando lavrares a terra, não te dará mais a sua força; fugitivo e vagabundo serás na Terra." (Gênesis 4:11-12 KJV).

Apesar de Caim pelos seus crimes haver merecido a sentença de morte, um Criador misericordioso ainda lhe poupou a vida, e concedeu-lhe oportunidade para o arrependimento. Mas Caim viveu apenas para endurecer o coração, para alentar a rebelião contra a autoridade divina, e tornar-se o chefe de uma linhagem de pecadores ousados e perdidos. Esse único apóstata, dirigido por Satanás, tornou-se o tentador para outros; e seu exemplo e influência exerceram uma força desmoralizadora, até que a Terra se corrompeu e se encheu de violência a ponto de reclamar a sua destruição (Gênesis 6:12-13 cf. Isaías 24:4-6).

Poupando a vida do primeiro homicida, Deus apresentou diante de todo o universo uma lição que dizia respeito ao grande conflito. A tenebrosa história de Caim e seus descendentes foi uma ilustração do que teria sido o resultado de permitir ao pecador viver para sempre, para prosseguir com sua rebelião contra Deus (cf. Gênesis 6:3;Romanos 8:7). A paciência de Deus apenas tornou o ímpio mais ousado e desafiador em sua iniquidade. Quinze séculos depois de pronunciada a sentença sobre Caim, o universo testemunhou os frutos de sua influência e exemplo, no crime e corrupção que inundaram a Terra. Tornou-se manifesto que a sentença de morte pronunciada contra a raça decaída, pela transgressão da lei de Deus, era não somente justa mas misericordiosa. Quanto mais vivessem os homens em pecado, mais perdidos se tornariam. A sentença divina, abreviando uma carreira de desenfreada iniquidade, e livrando o mundo da influência dos que se tornaram endurecidos na rebeldia, era uma bênção e não maldição.

Satanás está constantemente em atividade, com intensa energia e sob mil disfarces para representar falsamente o caráter e governo de Deus. Com planos extensos e bem organizados, e com poder maravilhoso está ele a agir para conservar sob seus enganos os habitantes do mundo (II Coríntios 11:14). Deus, o Ser infinito e todo sabedoria, vê o fim desde o princípio, e, ao tratar com o mal, Seus planos foram de grande alcance e compreensivos. Foi o Seu intuito não somente abater a rebelião, mas demonstrar a todo o universo a natureza da mesma. O plano de Deus estava a desdobrar-se, mostrando tanto Sua justiça como Sua misericórdia, e amplamente reivindicando Sua sabedoria e justiça em Seu trato com o mal.

Os santos habitantes de outros mundos estavam a observar com o mais profundo interesse os acontecimentos que se desenrolavam na Terra. Na condição do mundo que existira antes do dilúvio, viram o exemplo dos resultados da administração que Lúcifer se esforçara por estabelecer no Céu, rejeitando a autoridade de Cristo, e pondo à parte a lei de Deus. Naqueles arrogantes pecadores do mundo antediluviano, viram os súditos sobre os quais Satanás exercia domínio. Os pensamentos do coração dos homens eram somente e continuamente maus (Gênesis 6:5 cf. Romanos 8:5-8). Cada emoção, cada impulso e imaginação estava em conflito com os divinos princípios de pureza, paz e amor. Isto foi um exemplo da terrível depravação resultante da astúcia de Satanás, de remover das criaturas de Deus a restrição de Sua santa lei.

Pelos fatos manifestos no andamento do grande conflito, Deus demonstrará os princípios de Suas regras de governo, que foram falsificadas por Satanás e por todos os que ele enganou(b). Sua justiça será finalmente reconhecida pelo mundo inteiro, embora este reconhecimento haja de se fazer demasiado tarde para salvar os rebeldes. Ver-se-á que todos os que abandonaram os preceitos divinos colocaram-se ao lado de Satanás, em luta contra Cristo. Quando o príncipe deste mundo for julgado, e todos os que com ele se uniram participarem de sua sorte, o universo inteiro, como testemunha da sentença, declarará: "Justos e verdadeiros são os Teus caminhos, ó Rei dos santos." (Apocalipse 15:3 KJV).


Texto extraído de: WHITE, E. G. Patriarcas e Profetas, São Paulo: CPB, sec. I, cap. V, p. 71-79.
a. Apocalipse 12:17 cf. I João 3:4; Romanos 4:15; Romanos 7:7.

sábado, 15 de fevereiro de 2014

A Marca do Mal

Tanto a "besta" quanto a sua "imagem"(a) compartilham um dogma que: as mantêm fortemente unidas; submete os homens aos seus enganos e, se opõe ao selo de Deus - o sábado do quarto mandamento(b). Dentre os diversos erros disseminados por elas, somente o ensino da observância dominical possui estas peculiaridades reunidas, tornando-a a marca ou a principal distinção das instituições que retêm este falso "dia do Senhor"(c). Este ponto doutrinário, defendido por elas, demonstra a tentativa prepotente de usurpar a autoridade de Deus e de desviar a verdadeira adoração destinada a Ele.

A Bíblia em toda a sua extensão ensina que, unicamente o sétimo dia da semana foi santificado e abençoado por Deus, e destina-se a atender exclusivamente aos Seus propósitos. Porém, o homem em busca de satisfazer seus interesses particulares confronta constantemente as orientações de seu Criador (Romanos 8:5-9 cf. Jeremias 6:16). Deus nunca modificou qualquer mandamento do Decálogo e muito menos concedeu autoridade para que alguém assim procedesse. Apesar disso, a "besta e a sua imagem" proclamam com soberba que o domingo substituiu o sábado na lei de Deus, e conclamam que esta ultrajante transgressão seja obedecida.

A terceira mensagem angélica adverte quanto a aceitação desse falso dia de descanso dizendo: "Se alguém adora a besta e a sua imagem e recebe a sua marca na fronte ou sobre a mão, também esse beberá do vinho da cólera de Deus, preparado, sem mistura, do cálice da Sua ira, e será atormentado com fogo e enxofre, diante dos santos anjos e na presença do Cordeiro." (Apocalipse 14:9-10 RA).

A "marca" ou "sinal" da besta não é um chip, um código de barra, um símbolo místico ou o número 666 fixado no corpo. Estas fantasiosas especulações não são sustentadas pela Bíblia. Receber a "marca da besta" (a marca do sistema religioso apostatado) indica que a pessoa através de suas próprias convicções (de forma consciente - "na fronte"), ou, motivada pela conveniência de sua vida (de suas ações - "sobre a mão") reconhece que a "besta e sua imagem" possuem autoridade para substituir o sétimo dia da semana descrito no quarto mandamento, pelo primeiro dia (domingo). Aceitar esta mudança é consequentemente render à elas obediência e adoração. Ressaltando que, ninguém receberá essa marca sem antes conhecer plenamente as verdades sobre estas questões; mas receberá aquele que, embora ciente deste assunto, resolva adotar o falso dia de descanso.
"Quando esta questão for claramente colocada diante do mundo, aqueles que rejeitam o memorial divino da Criação - o sábado bíblico - escolhendo adorar e honrar o domingo - mesmo depois de ter pleno e cabal conhecimento de que este não é o dia apontado por Deus para a adoração - receberão a 'marca da besta'. Esta é a marca da rebelião; a besta afirma(d) que o fato dela haver alterado o dia de adoração é uma prova de sua autoridade em modificar a lei de Deus."1
E este conflito terá o seu auge quando as igrejas protestantes que defendem a guarda dominical, lideradas pela igreja de Roma (ICAR), exigirem que o Estado utilize seu poder para fazer valer de forma obrigatória a observância do domingo mediante lei civil, com punição aos infratores (Apocalipse 13:11-18), assim como já ocorrera no passado(e).

Nunca houve uma terceira opção e não haverá nos eventos finais deste mundo. "Até quando coxeareis entre dois pensamentos? Se o Senhor é Deus, segui-O; se é Baal, segui-o." (I Reis 18:21 RA). Assim como o remanescente fiel consolida sua lealdade a Deus e recebe o Seu selo (Apocalipse 7:2-3), em contraposição existem os que firmam-se na "besta e na sua imagem" e recebem o seu respectivo selo. O foco desta questão não centraliza-se meramente na escolha de um determinado dia, mas envolve a fidelidade para com a vontade de Deus expressa claramente em Sua lei (Êxodo 20:3-17 cf. Mateus 19:16-19Lucas 16:17), sobretudo no quarto mandamento, o centro do conflito final (Apocalipse 14:7 cf. Êxodo 20:11Apocalipse 14:12). No momento em que Lúcifer se tornou Satanás, este idealizou obter para si mesmo obediência e adoração das criaturas de Deus, e nos últimos momentos que lhe resta, fará isto com todo empenho auxiliado por seus agentes.2


a. A expressão "imagem da besta" refere-se a organização religiosa que será formadada por diversas igrejas protestantes e atuará segundo os mesmos princípios da "besta" descrita em Apocalipse 13:1-8. E, assim como esta última utilizava o poder político do(s) Estado(s) para impor suas doutrinas, igualmente ocorrerá com a sua "imagem". Acesse: Babilônia Denuncia - IIA Imagem do Mal.
b. Acesse: O Selo de Deus
c. Acesse: O "dia do Senhor"
1Nisto Cremos. (2003). 7.ª ed., São Paulo: CPB, cap. 12, p. 231.
2. Efésios 6:11-12; I João 2:1-4 cf. João 8:44; II Tessalonicenses 2:3-4 cf. Isaías 14:13-14, Ezequiel 28:12-18, Apocalipse 12:17.

sábado, 8 de fevereiro de 2014

A Imagem do Mal

Após o seu banimento do Céu, Satanás iniciou sua jornada em busca de novos adeptos e, infelizmente, encontrou na Terra receptividade para os seus enganos. Seu intuito a partir de então foi, além de usurpar o domínio deste mundo, anular a influência de Deus no homem e estabelecer a sua personalidade orgulhosa e ambiciosa.

Através da própria humanidade, Satanás tem disseminado o desprezo a Deus (II Tessalonicenses 2:3-4), deturpado continuamente os ensinos das Sagradas Escrituras (II Pedro 3:14-16) e, perseguido os que não se envolvem em suas artimanhas (Apocalipse 12:17). Estas coisas conduzem a terceira mensagem angélica a advertir severamente todo aquele que se submete as orientações desse anjo maligno:
"Se alguém adora a besta e a sua imagem e recebe a sua marca na fronte ou sobre a mão, também esse beberá do vinho da cólera de Deus, preparado, sem mistura, do cálice da Sua ira, e será atormentado com fogo e enxofre, diante dos santos anjos e na presença do Cordeiro. A fumaça do seu tormento sobe pelos séculos dos séculos(a) (...)" (Apocalipse 14:9-12 RA).
A mensagem do primeiro anjo proclama o evangelho eterno e convida à restauração da verdadeira adoração a Deus como Criador; o segundo anjo adverte contra todas as formas de adoração originadas em filosofias e tradições humana e, finalmente, o terceiro anjo proclama o mais solene aviso contra a adoração da "besta e de sua imagem"; que em última análise, envolve todo aquele que rejeita o evangelho da justificação pela fé(b).

Reflexo do mal

A "besta" citada em Apocalipse 14:9 (cf. Apocalipse 13:1-8) representa a igreja de Roma que se uniu ao Estado e dominou o mundo cristão durante vários séculos(c). Paulo menciona este poder religioso repressor como o "homem da iniquidade" (II Tessalonicenses 2:3-10) e Daniel cita-o por meio de um "chifre pequeno"(d) (Daniel 7:8;Daniel 7:24-25). Por sua vez, a "imagem da besta" simboliza a organização religiosa apóstata que será formada pelas igrejas protestantes, e que terá forte participação do Estado. Esta união ocorrerá quando as referidas igrejas tiverem abandonado o verdadeiro princípio da Reforma para satisfazer seus próprios interesses. Elas exigirão através da influência e força do Estado que os seus falsos ensinos, herdados da igreja de Roma, sejam seguidos. Esta união será a perfeita "imagem da besta", e a sua atuação será semelhante àquela praticada no passado pela igreja de Roma (ICAR). Assim, a "besta" (igreja romana) e a sua "imagem" (igrejas protestantes apostatadas) atuarão juntas e amparadas pelo poder civil (Estado) para impor incondicionalmente os seus ensinos e perseguir qualquer posicionamento contrário aos seus propósitos.

A mensagem do terceiro anjo proclama a mais solene e assustadora advertência da Bíblia. Ela revela que aqueles que se submeterem à autoridade humana durante a crise final da Terra, estarão adorando a "besta e a sua imagem" em vez de estar adorando a Deus. Durante esse conflito final duas classes distintas se desenvolverão. Uma dessas classes defenderá o evangelho das maquinações humanas e adorará a "besta e a sua imagem", trazendo sobre si mesma as mais terríveis consequências. A outra classe, em acentuado contraste, viverá de acordo com o verdadeiro evangelho e guardará "os mandamentos de Deus e a fé em Jesus" (Apocalipse 14:12).

"Aqui está a perseverança dos santos"

Satanás fará o possível para obrigar os remanescentes a unirem-se ao movimento apostatado, e para isso "ele fará uso de todas as formas de engano" (II Tessalonicenses 2:10 NVI cf. Mateus 24:23-24); não prevalecendo seus artifícios, ameaçará com isolamento e morte (Apocalipse 13:15). Entretanto, manterão a integridade até o fim aqueles que alicerçaram a vida em Jesus. Nessa hora tenebrosa os filhos de Deus se sustentarão fortemente na Bíblia e não renderão homenagem a ninguém, exceto a Cristo (Apocalipse 15:2-3).

A fé em Jesus e a obediência aos mandamentos de Deus são dois aspectos importantes na vida cristã.1 Estes mandamentos são reflexos do caráter de Deus, pois expõem a norma de Sua justiça (Isaías 51:4Romanos 7:12), e Ele deseja que cada pessoa retenha os preceitos de Sua lei (Hebreus 10:15-17Eclesiastes 12:13). No entanto, esse objetivo é dificultado pela condição pecaminosa que domina cada indivíduo, pois "a mentalidade da carne é inimiga de Deus porque não se submete à lei de Deus, nem pode fazê-lo." (Romanos 8:7 NVI). Apesar de seus melhores esforços o homem continuamente está destituído da glória de Deus (Romanos 3:23). Contudo, Jesus veio para capacitar e restaurá-lo à Sua imagem. Veio para mostrar como é o Pai, ampliando neste sentido o significado de Sua lei.2 Cada pessoa pode guardar os preceitos de Deus unicamente por meio do poder de Cristo, e assim refletir a imagem divina (Romanos 8:3-4). A igreja remanescente honra os mandamentos da lei e os observa, não por legalismo, mas por revelação da personalidade e vontade de Deus; pelo direcionamento de vida que eles indicam.3

A questão final envolverá a falsa e verdadeira adoração, o verdadeiro e o falso evangelho. A terceira mensagem angélica dirige a atenção para as consequências de se recusar o eterno evangelho de Cristo, o que consequentemente é a recusa do convite para participar da verdadeira adoração anunciada pela primeira mensagem angélica. Ela descreve vividamente os resultados finais das decisões relacionada a adoração. A decisão por certo não é fácil, pois qualquer que seja ela, envolverá sofrimento. Aqueles que optam por adorar a Deus sofrerão a ira do dragão (Apocalipse 12:17) e, num determinado momento chegarão a ser ameaçados de morte (Apocalipse 13:15), ao passo que aqueles que escolhem adorar a "besta e sua imagem" lhes recairão as sete últimas pragas e, adiante, enfrentarão o "lago de fogo" (Apocalipse capítulos 15 e 16Apocalipse 20:14-15).

Contudo, ainda que ambas as decisões impliquem sofrimento, os resultados finais são diferentes. Os adoradores do Criador escaparão da ira mortal do dragão e estarão em pé com o Cordeiro no monte Sião (Apocalipse 7:2-4;Apocalipse 14:1 cf. Joel 2:32). Diferentemente, os adoradores da "besta e de sua imagem" receberão a plenitude da ira de Deus e morrerão na presença dos santos anjos e do Cordeiro (Apocalipse 14:9-10Apocalipse 20:11-15).

Todos terão que decidir em que lado estarão. Se alguém escolher a justificação pela fé, isto será demonstrado em sua participação no culto que Deus aprova; se alguém escolher a justificação pelas obras, isto será demonstrado por sua participação numa forma de culto que Deus proibiu, mas que a "besta e sua imagem" ordenam - uma adoração produzida à imagem do homem (cf. II Tessalonicenses 2:3-4Gênesis 4:3-7). Deus não pode aceitar esta última forma de adoração porque ela oferece prioridade aos mandamentos dos homens e não aos mandamentos de Deus(e) (Marcos 7:7-9Colossenses 2:8). Ela procura a justificação através das obras dos homens e não pela fé que decorre da completa submissão ao Deus Criador, Redentor e Recriador.4

A fé que conduz a Deus e que resistirá a qualquer dificuldade nos eventos finais deste mundo esta exemplificada na história de Sadraque, Mesaque e Abede-Nego (Daniel capítulo 3). Assim, a terceira mensagem angélica é, em sua essência, uma mensagem de justificação pela fé.
"Os terríveis juízos pronunciados contra o culto à besta e sua imagem (Apocalipse 14:9-11) deveriam levar todos a diligente estudo das profecias para aprenderem o que é o sinal da besta, e como devem evitar recebê-lo. As massas populares porém, cerram os ouvidos à verdade, volvendo-se às fábulas. Olhando para os últimos dias, declarou o apóstolo Paulo que: 'não suportarão a sã doutrina; ao contrário, sentindo coceira nos ouvidos, juntarão mestres para si mesmos, segundo os seus próprios desejos.' (II Timóteo 4:3NVI). Chegamos, já, a esse tempo. As multidões rejeitam a verdade das Escrituras, por ser ela contrária aos desejos do coração pecaminoso e amante do mundo; e Satanás lhes proporciona os enganos que amam."5
Deus tem Seus filhos em todas as igrejas, mas é através da igreja remanescente que Ele proclama a mensagem que deverá restaurar a verdadeira adoração; mediante o chamamento de Seu povo para fora dos círculos da apostasia, os prepara para o retorno de Cristo. Reconhecendo que muitos dentre o povo de Deus ainda deverão unir-se ao povo remanescente, este tem clara percepção de suas imperfeições e fraquezas quando tenta executar sua solene missão. Percebe que é unicamente através da graça de Deus que lhe será possível cumprir sua monumental tarefa (João 15:5).

À luz do breve retorno de Cristo e da necessidade de preparo para encontrá-Lo, o compassivo e urgente chamado de Deus é encaminhado: "Retirai-vos dela, povo Meu, para não serdes cúmplices em seus pecados e para não participardes dos seus flagelos; porque os seus pecados se acumularam até ao Céu, e Deus Se lembrou dos atos iníquos que ela praticou." (Apocalipse 18:4-5 RA).


Texto baseado em: Nisto Cremos. (2003). 7.ª ed., São Paulo: CPB, cap. 12.
a. Acesse: Fogo Extinguível - II (em: "Castigo Eterno").
b. Todo o processo de justificação é coordenado por Deus (Efésios 2:8-9); porém, ele é iniciado somente quando o pecador arrepende-se de seus erros e recorre ao sacrifício de Cristo como meio de obter o perdão (II Coríntios 7:10; Hebreus 4:14-16; Hebreus 9:27-28). Uma vez perdoado ou justificado, o pecador deve manter-se em constante obediência a Deus, o que evitará que a sua anterior condição pecaminosa e culpa retornem ("vai e não peques mais", João 8:11 cf. I João 3:4; Romanos 7:7). A fé exigida para que haja esse processo de justificação (cf. Hebreus 11:6), é terrível e constantemente substituída por ilusórias práticas ou obras humanas que envolvem: penitências, confessionários, uso de amuletos, e etc. Atualmente, o protestantismo à semelhança da igreja de Roma, vem adotando obras carnais como meio de obter - forçadamente - perdão e outros favores divinos. A superstição e os costumes que predominaram a igreja romana na idade média, envolvem fortemente várias igrejas protestantes da atualidade (sobretudo os seguimentos pentecostal e neo-pentecostal); o comércio de indulgências e de outros elementos religiosos estão se materializado novamente no mercado de objetos que supostamente resolvem os anseios daqueles que os adquirem (após pagamento de certa quantia determinada pelo líder religioso); igualmente, as ofertas e os dízimos estão sendo deturpados com os mesmos propósitos. Estranhas cerimônias e aquisições de objetos, jamais ensinadas pelas Escrituras, são consideradas como essenciais nos chamados "cultos" de libertação, de milagres, de descarrego, de finanças e etc. Estas, e outras práticas humanas inúteis e repugnantes, excluem a justificação pela fé que Deus deseja realizar em cada pecador.
c. Acesse: Babilônia DenunciadaBabilônia Denunciada - IIPrincípio do Dia Profético (em: "Um Tempo, Dois Tempos e Metade de Um Tempo").
d. O "chifre pequeno" citado em Daniel 8:9-12 refere-se ao império de Roma que teve duas épocas distintas: pagã e papal. Isso inclui naturalmente a atuação da igreja de Roma nos eventos descritos em Daniel capítulo 8. Para maiores esclarecimentos acesse: Roma versus Antíoco Epifânio.
1. Hebreus 11:6; Tiago capítulo 2; Êxodo 20:3-17 cf. Mateus 19:16-19, Tiago 2:8-13, Lucas 16:17.
2. Isaías 42:20-21 cf. Mateus 5:17-19; João 14:21 cf. João 10:30.
3. Ezequiel 11:19-20; Hebreus 8:10-12; Hebreus 10:16-17 cf. Jeremias 31:31-34, Ezequiel 22:26, Provérbios 7:2.
4. Jó 4:17; Jó 36:3; Salmos 124:8; Isaías 44:6; Isaías 48:17; Isaías 65:17; Isaías 66:22-23; Apocalipse 21:5.
5. WHITE, E. G. Grande Conflito, O; São Paulo: CPB, sec. IV, cap. 37, p. 594.

sábado, 1 de fevereiro de 2014

A Origem do Mal

Enquanto todos os seres criados reconheceram a lealdade pelo amor, houve perfeita harmonia por todo o universo de Deus. Deleitavam-se em refletir a Sua glória, e patentear o Seu louvor. E enquanto foi supremo o amor para com Deus, o amor de uns para com outros foi cheio de confiança e abnegado. (...)

Sobreveio, porém, uma mudança neste estado de felicidade. Houve um ser que perverteu a liberdade que Deus concedera as Suas criaturas. O pecado originou-se com aquele que, abaixo de Cristo, fora o mais honrado por Deus, e o mais elevado em poder e glória entre os habitantes do Céu. Lúcifer, "filho da alva", era o primeiro dos querubins cobridores(a), santo, incontaminado. Permanecia na presença do grande Criador, e os incessantes raios de glória que cercavam o eterno Deus, repousavam sobre ele. Assim diz o Senhor Jeová:
"(...) Você era o modelo da perfeição, cheio de sabedoria e de perfeita beleza. Você estava no Éden, no jardim de Deus; todas as pedras preciosas o enfeitavam. (...) Você foi ungido como um querubim guardião, pois para isso Eu o designei. Você estava no monte santo de Deus e caminhava entre as pedras fulgurantes. Você era inculpável em seus caminhos desde o dia em que foi criado até que se achou maldade em você." (Ezequiel 28:12-15 NVI).
Pouco a pouco Lúcifer veio a condescender com o desejo de exaltação própria. Dizem as Escrituras: "Elevou-se o teu coração por causa da tua formosura, corrompeste a tua sabedoria por causa do teu resplendor. (...)" (Ezequiel 28:17 YLT). "E tu dizias no teu coração: 'Eu subirei ao Céu, acima das estrelas de Deus exaltarei o meu trono. (...) serei semelhante ao Altíssimo'." (Isaías 14:13-14 YLT).

Se bem que toda a sua glória proviesse de Deus, este poderoso anjo veio a considerá-la como pertencente a si próprio. Não contente com sua posição, embora fosse mais honrado do que a hoste celestial, arriscou-se a cobiçar a homenagem devida unicamente ao Criador. Em vez de procurar fazer com que Deus fosse o alvo supremo das afeições e fidelidade de todos os seres criados, consistiu o seu esforço em obter para si o serviço e lealdade deles. E, cobiçando a glória que o infinito Pai conferira a Seu Filho, este príncipe dos anjos aspirou ao poder que era a prerrogativa de Cristo apenas.

Quebrantou-se então a perfeita harmonia do Céu. A disposição de Lúcifer para servir a si em vez do Criador, suscitou um sentimento de apreensão ao ser observada por aqueles que consideravam a glória de Deus suprema. No conselho celestial os anjos insistiam com Lúcifer. O Filho de Deus apresentou perante ele a grandeza, a bondade e a justiça do Criador; e, a natureza imutável e sagrada de Sua lei. Mas a advertência, feita com amor e misericórdia infinitos, apenas despertou espírito de resistência. Lúcifer consentiu que prevalecessem seus sentimentos de inveja para com Cristo, e se tornou mais decidido. (...)

O Rei do universo convocou os exércitos celestiais perante Ele, para, em sua presença, apresentar a verdadeira posição de Seu Filho, e mostrar a relação que Este mantinha para com todos os seres criados. (...) Os anjos alegremente reconheceram a supremacia de Cristo, e, prostrando-se diante dEle, extravasaram seu amor e adoração. Lúcifer curvou-se com eles; mas em seu coração havia um conflito estranho, violento. A verdade, a justiça e a lealdade estavam a lutar contra a inveja e o ciúme. A influência dos santos anjos pareceu por algum tempo levá-lo com eles. Ao ascenderem os cânticos de louvores, em melodiosos acordes, avolumados por milhares de alegres vozes, o espírito do mal pareceu subjugado; indizível amor fazia fremir todo o seu ser; em concerto com os adoradores destituídos de pecado, expandia-se-lhe a alma em amor para com o Pai e o Filho.

De novo, porém, achou-se repleto de orgulho por sua própria glória. Voltou-lhe o desejo de supremacia, e uma vez mais condescendeu com a inveja de Cristo. As altas honras conferidas a Lúcifer não eram apreciadas como um dom especial de Deus, e, portanto, não provocavam lhe gratidão para com o seu Criador. Ele se gloriava em seu brilho e exaltação, e almejava ser igual a Deus. Era amado e reverenciado pelo exército celestial, anjos se deleitavam em executar suas ordens, e estava ele revestido de sabedoria e glória mais do que todos eles. Contudo, o Filho de Deus era mais exaltado do que ele, sendo um em poder e autoridade com o Pai. Partilhava dos conselhos do Pai, enquanto Lúcifer não penetrava assim nos propósitos de Deus. "Por que", perguntava este poderoso anjo, "deveria Cristo ter a primazia? Por que é Ele mais honrado do que Lúcifer?"

Deixando seu lugar na presença imediata do Pai, Lúcifer saiu a difundir o espírito de descontentamento entre os anjos. Ele agia em misterioso segredo, e durante algum tempo escondeu seu propósito real sob uma aparência de reverência para com Deus. Começou a insinuar dúvidas com respeito às leis que governavam os seres celestiais, dando a entender que, conquanto pudessem as leis ser necessárias para os habitantes dos mundos, não necessitavam de tais restrições os anjos, mais elevados por natureza, pois sua sabedoria era um guia suficiente. Não eram eles seres que pudessem acarretar desonra a Deus; todos os seus pensamentos eram santos; não havia para eles maior possibilidade de errar para com o próprio Deus.

A exaltação do Filho de Deus à igualdade com o Pai, foi representada como sendo uma injustiça a Lúcifer, o qual, pretendia-se, ter também direito à reverência e à honra. Este príncipe dos anjos alegava que, se pudesse tão somente alcançar a sua verdadeira e elevada posição, grande bem resultaria para todo o exército do Céu; pois era seu objetivo conseguir liberdade para todos. (...) Muitos dos anjos ficaram cegos pelos enganos de Lúcifer.

Tirando vantagem da amável e leal confiança nele depositada pelos seres santos que estavam sob suas ordens, com tal arte infiltrara em suas mentes a sua própria desconfiança e descontentamento que sua participação não foi percebida. Lúcifer havia apresentado os propósitos de Deus sob uma luz falsa, interpretando-os mal e torcendo-os, de modo a incitar a dissensão e descontentamento. Astuciosamente levou os ouvintes a dar expressão aos seus sentimentos; então eram tais expressões repetidas por ele quando isto servisse aos seus intuitos, como prova de que os anjos não estavam completamente de acordo com o governo de Deus. Ao mesmo tempo em que, de sua parte, pretendia uma perfeita fidelidade para com Deus, insistia que modificações na ordem e leis do Céu eram necessárias para a estabilidade do governo divino.

Assim, enquanto trabalhava para provocar oposição à lei de Deus, e infiltrar seu próprio descontentamento na mente dos anjos sob seu comando, ostensivamente estava ele procurando remover o descontentamento e reconciliar anjos desafetos com a ordem do Céu. Ao mesmo tempo em que secretamente fomentava a discórdia e a rebelião, com uma astúcia consumada fazia parecer como se fosse seu único intuito promover a lealdade, e preservar a harmonia e a paz. (...)

Com grande misericórdia, de acordo com o Seu caráter divino, Deus suportou longamente a Lúcifer. O espírito de descontentamento e desafeição nunca antes havia sido conhecido no Céu. Era um elemento novo, estranho, misterioso, inexplicável. O próprio Lúcifer não estivera a princípio ciente da natureza verdadeira de seus sentimentos; durante algum tempo receou exprimir a ação e imaginações de sua mente; todavia não as repeliu. Não via para onde se deixava levar. Entretanto, esforços que somente o amor e a sabedoria infinitos poderiam imaginar, foram feitos para convencê-lo de seu erro. Provou-se que sua desafeição era sem causa, e fez-se-lhe ver qual seria o resultado de persistir em revolta. Lúcifer estava convencido de que não tinha razão. Viu que "justo é o Senhor em todos os Seus caminhos, e santo em todas as Suas obras" (Salmos 145:17 YLT); que os estatutos divinos são justos, e que, como tais, ele os deveria reconhecer perante todo o Céu. Houvesse ele feito isto, poderia ter salvo a si mesmo e a muitos anjos.

Ele não tinha naquele tempo repelido totalmente sua lealdade a Deus. Embora tivesse deixado sua posição como querubim cobridor, se contudo estivesse disposto a voltar para Deus, reconhecendo a sabedoria do Criador, e satisfeito por preencher o lugar a ele designado no grande plano de Deus, teria sido reintegrado em suas funções. Chegado era o tempo para uma decisão final; deveria render-se completamente à soberania divina, ou colocar-se em franca rebelião. Quase chegou à decisão de voltar; mas o orgulho o impediu disto. Era sacrifício demasiado grande, para quem fora tão altamente honrado, confessar que estivera em erro, que suas imaginações eram errôneas, e render-se à autoridade que ele procurara demonstrar ser injusta.

Um compassivo Criador, sentindo terna piedade por Lúcifer e seus seguidores, procurava fazê-los retroceder do abismo de ruína em que estavam prestes a imergir. Sua misericórdia, porém, foi mal-interpretada. Lúcifer apontou a longanimidade de Deus como uma prova de sua superioridade, como indicação de que o Rei do universo ainda concordaria com suas imposições. Se os anjos permanecessem firmes com ele, declarou, poderiam ainda ganhar tudo que desejassem. Persistentemente defendeu sua conduta, e entregou-se amplamente ao grande conflito contra seu Criador. Assim foi que Lúcifer, "o portador de luz", aquele que participava da glória de Deus, que servia junto ao Seu trono, tornou-se, pela transgressão, Satanás, o "adversário" de Deus e dos seres santos, e destruidor daqueles a quem o Céu confiou a guia e guarda.

Rejeitando com desdém os argumentos e rogos dos anjos fiéis, acusou-os de serem escravos iludidos. A preferência mostrada para com Cristo declarou ele ser um ato de injustiça tanto para si como para todo o exército celestial, e anunciou que não mais se sujeitaria a esta usurpação dos direitos, seus e deles. Nunca mais reconheceria a supremacia de Cristo. Resolvera reclamar a honra que deveria ter sido conferida a ele, e tomar o comando de todos os que se tornassem seus seguidores; e prometeu àqueles que entrassem para as suas fileiras um governo novo e melhor, sob o qual todos desfrutariam liberdade. Grande número de anjos deram a entender seu propósito de o aceitar como seu chefe. Lisonjeado pelo apoio com que suas insinuações eram recebidas, esperou conquistar todos os anjos para o seu lado, tornar-se igual ao próprio Deus, e ser obedecido por todo o exército celestial.

Os anjos fiéis ainda instavam com ele e com os que com ele simpatizavam, para que se submetessem a Deus; apresentavam-lhes o resultado inevitável caso se recusassem a isso: Aquele que os criara poderia subverter seu poder, e castigar de maneira notável sua revoltosa ousadia. Nenhum anjo poderia com êxito opor-se à lei de Deus, que é tão sagrada como Ele próprio. Advertiram todos a que fechassem os ouvidos ao raciocínio enganador de Lúcifer, e insistiram com este e seus seguidores para buscarem a presença de Deus sem demora, e confessarem o erro de pôr em dúvida Sua sabedoria e autoridade.

Muitos estiveram dispostos a dar atenção a este conselho, arrepender-se de sua desafeição, e procurar de novo ser recebidos no favor do Pai e de Seu Filho. Lúcifer, porém, tinha pronto outro engano. O grande rebelde declarou então que os anjos que com ele se uniram tinham ido muito longe para voltarem; que ele conhecia a lei divina, e sabia que Deus não perdoaria. Declarou que todos os que se sujeitassem à autoridade do Céu seriam despojados de sua honra, rebaixados de sua posição. Quanto a si, estava decidido a nunca mais reconhecer a autoridade de Cristo. A única maneira de agir que restava a ele e seus seguidores, dizia, consistia em vindicar sua liberdade, e adquirir pela força os direitos que não lhes haviam sido de boa vontade concedidos.

Tanto quanto dizia respeito ao próprio Satanás, era verdade que ele havia ido agora demasiado longe para que pudesse voltar. Mas não era assim com os que tinham sido iludidos pelos seus enganos. Para estes, os conselhos e rogos dos anjos fiéis abriram uma porta de esperança; e, se houvessem eles atendido a advertência, poderiam ter sido arrancados da cilada de Satanás. Mas ao orgulho, ao amor para com seu chefe, e ao desejo de uma liberdade sem restrições permitiu-se terem o domínio, e as instâncias do amor e misericórdia divinos foram finalmente rejeitadas.

Deus permitiu que Satanás levasse avante sua obra até que o espírito de desafeto amadurecesse em ativa revolta. Era necessário que seus planos se desenvolvessem completamente a fim de que todos pudessem ver sua verdadeira natureza e tendência. Lúcifer, sendo o querubim ungido, fora altamente exaltado; era grandemente amado pelos seres celestiais, e forte era sua influência sobre eles. O governo de Deus incluía não somente os habitantes do Céu, mas de todos os mundos que Ele havia criado; e Lúcifer concluiu que, se ele pôde levar consigo os anjos do Céu à rebelião, poderia também levar todos os mundos. (...) Seu poder para enganar era muito grande. Disfarçando-se sob a capa da falsidade, alcançara uma vantagem. Todos os seus atos eram de tal maneira revestidos de mistério, que era difícil aos anjos descobrir a verdadeira natureza de sua obra. (...) Mesmo os anjos fiéis não podiam discernir-lhe completamente o caráter, ou ver para onde sua obra estava a levar.

Lúcifer havia a princípio dirigido suas tentações de tal maneira que ele próprio não pareceu achar-se comprometido. Os anjos que ele não pôde trazer completamente para o seu lado, acusou-os de indiferentes aos interesses dos seres celestiais. Da mesma obra que ele próprio estava a fazer, acusou os anjos fiéis. Consistia sua astúcia em perturbar com argumentos sutis, referentes aos propósitos de Deus. Tudo que era simples ele envolvia em mistério, e por meio de artificiosa perversão lançava a dúvida sobre as mais claras declarações de Jeová. E sua elevada posição, tão intimamente ligada com o governo divino, dava maior força a suas representações. (...)

Procurara falsificar a Palavra de Deus, e de maneira errônea figurara Seu plano de governo, pretendendo que Deus não era justo ao impor leis aos anjos; que, exigindo submissão e obediência de Suas criaturas, estava simplesmente a procurar a exaltação de Si mesmo. (...) Satanás fizera com que parecesse estar ele procurando promover o bem do universo. O verdadeiro caráter do usurpador e seu objetivo real devem ser compreendidos por todos. Ele deve ter tempo para manifestar-se pelas suas obras iníquas.

A discórdia que sua conduta determinara no Céu, Satanás lançara sobre o governo de Deus. Todo o mal declarou ele ser o resultado da administração divina. Alegava que era seu objetivo aperfeiçoar os estatutos de Jeová. Por isso permitiu Deus que ele demonstrasse a natureza de suas pretensões, a fim de mostrar o efeito de suas propostas mudanças(b) na lei divina. A sua própria obra o deve condenar. Satanás pretendera desde o princípio que não estava em rebelião. O universo todo deve ver o enganador desmascarado.

Mesmo quando foi expulso do Céu, a Sabedoria infinita não destruiu Satanás. (...) Os habitantes do Céu, e dos mundos, não estando preparados para compreender a natureza ou consequência do pecado, não poderiam ter visto então a justiça de Deus na destruição de Satanás.

Houvesse ele sido imediatamente destruído, alguns teriam servido a Deus pelo temor em vez de o fazer pelo amor. A influência do enganador não teria sido completamente destruída, tampouco o espírito de rebelião teria sido totalmente desarraigado. Para o bem de todo o universo, através dos intérminos séculos, ele deveria desenvolver mais completamente seus princípios, a fim de que suas acusações contra o governo divino pudessem ser vistas sob sua verdadeira luz, por todos os seres criados; a justiça e a misericórdia de Deus, bem como a imutabilidade de Sua lei, pudessem para sempre ser postas fora de toda a questão.

A rebelião de Satanás deveria ser uma lição para o universo, durante todas as eras vindouras - perpétuo testemunho da natureza do pecado e de seus terríveis resultados. A atuação do governo de Satanás, seus efeitos tanto sobre os homens como sobre os anjos, mostrariam qual seria o fruto de se pôr de parte a autoridade divina. Testificariam que, ligado à existência do governo de Deus, está o bem-estar de todas as criaturas que Ele fez. Assim, a história desta terrível experiência com a rebelião seria uma salvaguarda perpétua para todos os seres santos, para impedir que fossem enganados quanto à natureza da transgressão, para salvá-los de cometer pecado, e de sofrerem sua punição.

Aquele que governa no Céu é O que vê o fim desde o princípio - o Ser perante o qual os mistérios do passado e do futuro estão igualmente expostos, e que, para além da miséria, trevas e ruína que o pecado acarretou, contempla o cumprimento de Seus propósitos de amor e bênçãos. Se bem que "nuvens escuras e espessas O cercam; retidão e justiça são a base do Seu trono." (Salmos 97:2 NVI). E isto os habitantes do universo, tanto fiéis como infiéis, compreenderão um dia. "Ele é a Rocha, as Suas obras são perfeitas, e todos os Seus caminhos são justos. É Deus fiel, que não comete erros; justo e reto Ele é." (Deuteronômio 32:4 NVI).


Texto extraído de: WHITE, E. G. Patriarcas e Profetas, São Paulo: CPB, sec. I, cap. I, p. 35-43.
a. Uma categoria de anjos. A envergadura de suas assas estende-se sobre o trono de Deus envolvendo diretamente a Sua glória. São também responsáveis pela administração dos cânticos celestiais. (cf. Êxodo 25:20-22, II Crônicas 3:10-13, II Crônicas 5:13-14, Ezequiel 28:13-14).