sábado, 31 de maio de 2014

Os Ministérios da Lei de Deus

"E, se o ministério da morte, gravado com letras em pedras, se revestiu de glória, a ponto de os filhos de Israel não poderem fitar a face de Moisés, por causa da glória do seu rosto, ainda que desvanecente, como não será de maior glória o ministério do Espírito!" (II Coríntios 3:7-8 RA).
Há um esforço por parte dos antinomistas(a) em tentar caracterizar a lei de Deus como sendo o "ministério da morte" citado em II Coríntios 3:7. Mas este inútil intuito é dissolvido pela própria abordagem de Paulo que discorre sobre dois ministérios e não sobre a lei. A palavra "lei" sequer é mencionada, e isso é fundamental para a análise desta questão. Muitos não conseguem diferenciar os termos "lei", "ministério" e "aliança" entre si, e os tratam como sinônimos.

Lei é o mecanismo usado para expressar determinados princípios e padrões de conduta, e exigir que os mesmos sejam seguidos. Na Bíblia, uma lei é constituída por mandamentos ou preceitos, como por exemplo, a lei de Deus que é formada por Dez Mandamentos. Ministério refere-se aos meios administrativos pelos quais algo é ensinado, aplicado e preservado. Aliança consiste em aliar-se, geralmente em comum acordo, após aprovação de uma finalidade ou ação específica.

Assim, observa-se que existe uma grande diferença entre "lei", "ministério" e "aliança". Não há valor algum na existência de uma lei se ela não for transmitida, praticada e zelada; por isso a necessidade de um ministério, de uma gestão para coordená-la. E por meio da aliança realizada entre Deus e Abraão, o povo de Israel foi convocado para ministrar, também, a lei (Gênesis 18:19Gênesis 26:4-5Êxodo capítulos 19 e 20). E é justamente sobre as características e diferenças entre o velho e novo ministérios da lei de Deus que Paulo centraliza o seu discurso em II Coríntios capítulo 3.

"Ministério da morte"

O "ministério da morte", também chamado de "ministério da condenação" (II Coríntios 3:9), refere-se ao "velho ministério" que coordenou a "antiga aliança" e, também, a lei de Deus. Esta aliança foi revogada, principalmente, pela negligência dos israelitas em honrá-la.1

Paulo ao comparar a antiga e nova alianças, demonstrou que esta última é dirigida por um "novo ministério" chamado de "ministério da justiça" ou "ministério do Espírito". E este "novo ministério" tornou-se a glória resplandecente, em comparação com a glória do "velho ministério" (ministério da condenação) que se tornara empalidecida e finalmente desaparecera: "Porque, se o ministério da condenação foi glória, em muito maior proporção será glorioso o ministério da justiça. Porquanto, na verdade, o que, outrora, foi glorificado, neste respeito, já não resplandece, diante da atual sobreexcelente glória." (II Coríntios 3:9-10 RA cf.Hebreus 3:1-3).

Muitos judeus, antes de aceitarem a Cristo como salvador acreditavam que a glória manifestada no Sinai e, o "velho ministério" da "antiga aliança" exercido pelos levitas, eram a última palavra em salvação. Mas posteriormente entenderam que a glória manifestada por Cristo e, o "novo ministério" estabelecido com a "nova aliança", superavam e substituíam tanto a "antiga aliança" quanto o "velho ministério" que a gerenciava (Hebreus capítulo 8 cf. II Coríntios 3:14-16).

Por simples figura de linguagem o "velho ministério" da "antiga aliança" é adjetivado de "ministério da morte", e a própria Bíblia exemplifica esta figura de linguagem utilizada por Paulo: certa vez, os filhos dos profetas reuniram-se em torno da "panela grande" que continha colocíntidas (ervas tóxicas), então clamaram aos que delas alimentavam-se: "Homem de Deus, há morte na panela." (II Reis 4:38-40 NVI). Em linguagem exata (literal), disseram que havia algo no interior da panela que iria causar a morte, mas ao fazerem o alerta trocaram a causa pelo efeito. Outro exemplo encontra-se em Isaías 28:18 (RA): "A vossa aliança com a morte será anulada (...)"; obviamente que ninguém faz aliança com a morte, isso no mínimo seria bizarro.

"Gravado com letras em pedras"
Gravado com letras em pedras é uma clara referência às duas tábuas de pedra onde foram escritos os Dez Mandamentos.2 O "velho ministério" da "antiga aliança" tinha sua legitimidade(b) administrativa fundamentada na lei de Deus; ou seja, sem esta lei para: estabelecer os princípios morais e éticos; revelar o pecado; e servir de base para os preceitos encontrados na lei de Moisés, todo o ministério (todo o gerenciamento) da "antiga aliança" perderia autoridade e propósito. Por isso a ênfase: "ministério da morte, gravado com letras em pedras". A legitimidade e os objetivos do "velho ministério" (ministério da morte) dependiam diretamente dos Dez Mandamentos contidos nas tábuas de pedra.

Paulo, no verso de II Coríntios 3:7 não diz que a lei de Deus (Dez Mandamentos) é o "ministério da morte". E não há a menor possibilidade desta classificação, pois ele mesmo afirma que esta lei: deve ser praticada (Romanos 2:13 cf. I Coríntios 7:19); está alicerçada no princípio do amor (Romanos 13:8-10); é ensinada pelo Espírito Santo (Romanos 8:5-8Hebreus 10:15-17); é santa, justa e boa (Romanos 7:12 cf. Romanos 7:15-16); que a fé e a graça não podem anulá-la (Romanos 3:31Romanos 6:15); e, agradava-se em obedecê-la (Romanos 7:22).

No verso de II Coríntios 3:3, Paulo enfatiza ainda que, na "nova aliança", Deus escreve os Dez Mandamentos "não em tábuas de pedra, mas em tábuas de carne, isto é, nos corações."3 E o próprio Cristo citou a obediência a estes mandamentos como sendo necessária para se obter a vida eterna(c) (Mateus 19:17-19 cf. Mateus 5:19-20). Então, como poderia algo que é ensinado pelo Espírito Santo e que conduz a vida eterna, ser chamado de "ministério da morte"?

Os Dez Mandamentos que formam a lei de Deus, quando transgredidos, denunciam o pecado e exigem justiça (I João 3:4Salmos 119:172); contudo, eles não orientam quanto ao julgamento e a devida punição a serem aplicados, as normas do "velho ministério" eram as responsáveis por isso, e elas estão descritas na lei de Moisés(d), não nas tábuas de pedra. Não há base bíblica que sustente a insinuação antinomista de que a lei de Deus (Decálogo) seja o "ministério da morte". Ademais, existe ainda dois problemas constrangedores que acompanham esta ilusória teoria: 1). Que motivo levaria Deus a conceder ao povo de Israel, reunido solenemente no monte Sinai, uma lei que representa morte? 2). Que Deus é este que trata de forma discriminada o Seu povo, reservando uma lei de amor e justiça na "nova aliança", enquanto na "antiga aliança" Ele entrega uma lei que reflete aflição e morte?

A glória no rosto de Moisés
"Ao descer do monte Sinai com as duas tábuas da aliança nas mãos, Moisés não sabia que o seu rosto resplandecia por ter conversado com o Senhor." (Êxodo 34:29 NVI). O próprio Moisés não percebeu a glória que irradiava de sua face, e não entendeu o porque dos israelitas fugirem dele quando se aproximava. Chamou-os para junto de si, mas eles não ousavam olhar para aquela face glorificada. Quando Moisés entendeu que o povo não podia contemplar o seu rosto, o cobriu com um véu (Êxodo 34:30-35).

A glória no rosto de Moisés abalava os filhos de Israel devido a violação deles contra a lei de Deus. Isto é uma ilustração dos sentimentos dos que infringem a lei divina, desejam remover de sua presença "a luz penetrante" que lhes provoca terror por causa de suas transgressões; mas, para aqueles que a obedecem, ela revela-se santa, justa, boa e agradável (Romanos 7:12 e 22 cf. Salmos 1:1-2). Apenas os que têm íntegra consideração para com a lei de Deus podem estimar devidamente a importância e o valor da expiação de Cristo tornada necessária por causa dos pecados cometidos contra ela (I João 3:4Isaías 53:5I Coríntios 15:3-4).

Ao longo de seu discurso, Paulo fez o contraste entre a "glória que permanece" e a "glória que se desvanece", entre o "mais glorioso" e o "menos glorioso". Em todos os casos a glória provém de Deus, mas na "nova aliança" há uma plena revelação de Sua glória na pessoa de Cristo, que permanece para sempre (João 1:14Apocalipse 5:13). Na "antiga aliança", a glória de Cristo apresentava-se refletida nos símbolos do cerimonialismo mosaico, o Redentor estava representado pelos emblemas e liturgias, as quais cederam lugar com a Sua chegada, a grande Realidade (Hebreus 9:9-12Daniel 9:27 cf. Mateus 27:51-53).

Aqueles que leem superficialmente o verso de II Coríntios 3:7 concluem desastrosamente que os Dez Mandamentos eram que desvaneciam (desapareciam), mas o que nitidamente se diz neste verso é que a glória refletida no rosto de Moisés era que perecia(e). A glória não estava nas tábuas de pedra. O reflexo da glória no rosto de Moisés se desvaneceu (sumiu), mas os mandamentos gravados em pedras permanecem em vigência. De forma análoga, o "velho ministério" era que desaparecia, não o Decálogo.4

Enquanto o rosto de Moisés refletia a glória de Deus, os serviços do santuário terrestre refletiam a presença de Cristo. O propósito de Deus era que o pecador nos dias da "antiga aliança" entendesse a atuação salvadora de Cristo e sentisse a Sua glória refletida no sistema litúrgico do tabernáculo. Porém, com a chegada de Cristo, o pecador tivera o privilégio de contemplar a glória da Realidade (João 1:29Hebreus 9:22-28), tornando a glória menor refletida pelos símbolos do santuário desnecessária (cf. II Coríntios 3:10).

Considerações Finais
O fracasso dos israelitas em ver a Cristo nos símbolos do sistema cerimonial caracteriza a história hebreia desde o Sinai até a Sua vinda. E esta cegueira os conduziu a recusar e solicitar que fosse crucificado.5 Desde modo, a expressão "ministério da morte" distingui adequadamente o período do "velho ministério", apesar de muitas exceções notáveis. O povo de Israel exerceu o "velho ministério" baseado somente na letra, sem a fé no Messias (Romanos 9:30-33 cf. Isaías 28:16), e isso os afastou do Espírito de Deus, resultando em morte aos transgressores da lei. O "novo ministério" veio para redirecionar a fé em Jesus e reaver o Espírito que vivifica. Por isso Paulo chama o "novo ministério" de "ministério da justiça" (II Coríntios 3:9 cf. Romanos 2:13) e "ministério do Espírito" (II Coríntios 3:8 cf. Romanos 7:14).

Embora a nação israelita tenha esquecido os reais motivos do ministério entregue à ela, sendo os principais: ter a Deus como o centro de suas vidas; reconhecer o Messias (Jesus Cristo) como único meio de salvação; e conduzir outras nações aos mesmos propósitos,6 Deus manteve estes objetivos na "nova aliança", porém sob a tutela de um novo ministério (ministério da justiça ou ministério do Espírito).

Na época em que Paulo escreveu as cartas aos coríntios (52-54 d.C.), os judeus insistiam em praticar o ritual de sacrifícios abolido com a crucifixão de Jesus. Somente com a destruição do templo de Jerusalém pelos romanos em 70 d.C., foi que cessou definitivamente para os judeus o que fora transitório. Paulo se refere às duas tábuas de pedra porque elas eram o fundamento legislativo que proporcionava autoridade administrativa e objetivo ao "velho ministério". Sem os Dez Mandamentos contidos nessas tábuas, o "velho ministério" não tinha motivos para existir; e o mesmo ocorre com o "novo ministério" estabelecido na "nova aliança" (Hebreus 8:8-13Hebreus 10:15-17).

O foco principal de II Coríntios capítulo 3 é explicar as diferenças(f) entre velho e novo ministérios (respectivamente pertencentes a antiga e nova alianças) e refutar os judaizantes(g) que rondavam a igreja de Corinto procurando impor as liturgias cerimoniais da lei de Moisés, assim como ocorreu nas igrejas de Antioquia, Galácia e Colossos.7 Eles consideravam que os rituais de sacrifícios da antiga aliança eram essenciais para a salvação(h) e, evidentemente, Paulo caracterizou o "velho ministério" que administrava esses rituais de "ministério da morte". Era inerte. Judeus e gentios encontram vida em Cristo, pois só nEle há salvação.


a. Indivíduo que rejeita os padrões de conduta determinados pela lei de Deus; aquele que defende que o comportamento humano não deve estar sujeito as regras de uma lei, sobretudo as divinas.
b. Que tem fundamento na lei; que é amparado por lei; que está em conformidade com a lei; que caracteriza-se por estar de acordo com os princípios da equidade, da moral e da razão defendidos por uma lei, quer seja essa lei divina ou humana.
e. A glória temporária no rosto de Moisés foi o resultado de sua comunhão com Deus no monte Sinai. Demonstrava aos que a viam, que ele, tinha estado na presença divina; era um depoimento silencioso de sua missão como representante de Deus e da obrigação do povo em ajustar-se a Seus preceitos. Essa glória confirmava a origem divina dos Dez Mandamentos e sua vigência obrigatória a todos os homens (I Coríntios 7:19 cf. Eclesiastes 12:13). Acesse: A lei do Tribunal Celestial.
f. As diferenças entre: o antigo e o novo; a letra e o Espírito; a glória que se desvanece e a glória que permanece; condenação e justificação; Moisés e Cristo. Em cada caso, o segundo termo é infinitamente superior ao primeiro.
g. Aquele que pratica os ritos judaicos e motiva outros a segui-los; aquele que procura converter outros ao judaísmo.
1. Isaías 1:1-18; Jeremias capítulo 11; Jeremias 31:31-36; Ezequiel capítulo 22; Oséias capítulo 4.
2. Êxodo 31:18; Êxodo 32:15-16; Êxodo 34:1-4; Êxodo 34:28-29; Deuteronômio 4:12-13.
3. Hebreus 8:9-13; Hebreus 10:15-17 cf. Isaías 8:16, Jeremias 31:31-36.
4. Salmos 119:89 cf. Êxodo 34:28, Apocalipse 11:19; Mateus 5:17-19; Mateus 19:17-19; Lucas 16:17 cf. Romanos 3:31, Romanos 6:15, Tiago 2:8-13.
5. Isaías 1:4; Isaías 53:1-5; João 1:10-11; Atos 13:27-29; II Coríntios 3:15-16.
6. Êxodo 19:5-6 cf. Gênesis 18:19, Gênesis 26:4-5, Romanos 3:2; Levítico 24:22; Isaías 51:4; Isaías 56:6-7; Romanos 3:29-30; Gálatas 3:28-29.
7. II Coríntios 11:3-5; Atos 15:1-6; Gálatas capítulo 2; Colossenses 2:16-19.

sábado, 24 de maio de 2014

A Graça e a Lei de Deus

No mundo religioso tem sido ensinado uma doutrina de "graça" tão errônea, que ela caracteriza-se como uma doutrina de desgraça. Através de ensinos distorcidos, Jesus tem sido apresentado como Alguém que nos livra de guardar os mandamentos de Deus ao invés de nos salvar de transgredi-los (cf. João 15:10I João 2:4I João 5:3).

É lamentável que o cristianismo seja assolado por uma espécie de "graça" que tem mais o sentido de indulgência(a) ou de um manto acobertador de iniquidades, do que o dom divino de salvação aos pecadores.

O falso ensino atribuído à graça tornou-se a maior deturpação teológica dos tempos, seu fundamento consiste na teoria de que: a lei foi anulada pela graça divina. E, associado a isto, defende-se a ideia da existência de duas épocas distintas, uma da lei (abrangendo o período do Velho Testamento) e outra da graça (abrangendo o período do Novo Testamento).

Dádiva imensurável
Graça é a misericórdia de Deus concedida ao pecador arrependido (II Coríntios 7:10Efésios 2:8-9). Graça consiste no perdão de Deus(b), disponível por causa do Seu imensurável amor pela humanidade, e este amor está manifestado no sacrifício de Jesus (João 3:16). A graça elimina o castigo de morte eterna que deveria ser aplicado a todo aquele que agiu contra a lei de Deus. "A alma que pecar, essa morrerá", "porque o pecado é a transgressão da lei" e "o salário do pecado é a morte". "Riscarei do Meu livro todo aquele que pecar contra Mim." E, "aqueles cujos nomes não foram encontrados no livro da Vida foram lançados no lago de fogo."1

"[...] Essa misericórdia e bondade são totalmente imerecidas. A graça de Cristo é gratuita para justificar o pecador, sem qualquer mérito ou exigência de sua parte. Justificação é o perdão total do pecado. No momento em que o pecador aceita a Cristo pela fé, ele é perdoado."2 Há, porém, um limite a essa graça. A misericórdia pode interceder por anos e ser negligenciada e rejeitada; vem, porém, o tempo em que essa misericórdia faz sua derradeira súplica. Mas o coração torna-se tão endurecido que cessa de atender ao Espírito Santo de Deus (cf. Hebreus 10:15-18Romanos 8:5-8). Então a suave, a atraente voz não mais suplica ao pecador (cf. Isaías 30:21), e cessam as reprovações e advertências.3

A lei de Deus é atuante e exigente, revela a transgressão e a condena. E é justamente porque ela traz condenação e não disponibiliza salvação que recorremos à graça. Sobre esta questão, o teólogo batista Augustus Strong declara:
"A graça é para ser considerada, contudo, não como revogando a lei, mas como reafirmando e estabelecendo-a (Rom. 3:31 - 'estabelecemos a lei'). Ao remover os obstáculos ao perdão na mente de Deus, e habilitando o homem a obedecer, a graça assegura o perfeito cumprimento da lei (Rom. 8:4 - 'que a justiça da lei se cumprisse em nós'). [...] Sem a graça, a lei tem apenas um aspecto exigente. Somente em conexão com a graça ela tornar-se 'a lei perfeita, a lei da liberdade' (Tiago 1:25)."4
E esta lei mencionada em Tiago 1:25 é incontestavelmente a lei de Deus(c), constituída por Dez Mandamentos (Tiago 2:8-13 cf. Mateus 19:16-19Romanos 13:8-10). Se ela tivesse sido abolida não existiria transgressão, pois não haveria o que transgredir; isso anularia a existência do pecado e consequentemente a condenação destinada a ele.5 E não havendo pecado, não há necessidade de graça, pois ela foi concedida pelos efeitos do pecado (Isaías capítulo 53). Sem a lei de Deus não há motivo para que a graça permaneça atuante (Romanos 5:18-21), uma pressupõe a outra. A graça além de nos salvar da condenação da lei, nos habilita a viver em harmonia com os seus preceitos.6 Não há contradição mas uma interdependência entre lei e graça. Elas se harmonizam e completam-se em suas respectivas funções.

Início da graça
É extremamente errado acreditar que a graça surgiu com a cruz do Calvário e que tenha substituído a lei.7Infelizmente é assim que muitos entendem as expressões "debaixo da lei" e "debaixo da graça" citadas em Romanos 6:14 (NVI). Se isso fosse verdade, como fica a situação dos pecadores antes da morte de Cristo? De que forma foram salvos? Este ponto não pode ser passado por alto, porque as Escrituras ensinam claramente que a salvação é obtida unicamente pela graça (Efésios 2:8-9 cf. Gálatas 5:4).

E se a graça não existia antes da cruz, consequentemente os pecadores que viveram nos tempos patriarcais e posteriores não se salvaram, pois viveram antes da graça (antes de Cristo). Alguns na tentativa de sanar a falha dessa falsa teoria alegam que os pecadores do Velho Testamento se salvaram pelas obras da lei, agravando ainda mais o erro na qual estão envolvidos. Os adeptos deste absurdo ensino terão que assumir que o Céu estará dividido em dois grupos: um a proclamar que foi salvo pelos seus méritos e esforços, por ter guardado a lei (isto seria um insulto a Jesus, um ultraje ao Seu sacrifício) e, o outro grupo que viveu depois da cruz, proclamando humildemente os louvores a Cristo que lhe concedeu a vida eterna por meio da graça.

A Bíblia não ensina a existência de um período da lei e outro da graça separados pela cruz, e tampouco ensina que haverá dois grupos de remidos, um salvo pela "lei" e outro pela "graça". Estas coisas são nocivas invenções mantidas pelo homem, e extremamente ofensivas ao plano de salvação elaborado por Deus. Tais conceitos são blasfemos e devem ser rejeitados. A verdade é que: a graça vem de tempos longínquos (Romanos 16:25-27), que o "Cordeiro foi morto deste a fundação do mundo" (Apocalipse 13:8 RA), que a graça "nos foi dada em Cristo Jesus, antes de tempos eternos" (II Timóteo 1:8-10 RA).

Em Hebreus capítulo 11 estão listados aqueles que, antes de Cristo, obtiveram a salvação pela fé, alcançaram a misericórdia pela fé no Cordeiro de Deus (cf. João 1:29). Abraão foi salvo pela graça (Romanos 4:1-3Gálatas 3:8-9), Davi da mesma forma conquistou a graça pela fé em Cristo (Romanos 4:6).

A graça sempre esteve estendida a todos os homens (Tito 2:11-14Romanos 5:18). Ela estava planejada antes mesmo do pecado de Adão (Tito 1:1-2), e começou a vigorar desde o Éden (Gênesis capítulo 3). Mas um dia ela será retirada(d), cessará de vigorar (Apocalipse 7:1-3Apocalipse 16:17-21 cf. Hebreus 4:16). Portanto, os pecadores da época do Velho Testamento também se salvaram pela graça. Então por que afirmar que ela veio depois da cruz?

Em matéria de salvação toda a humanidade sempre esteve "debaixo da graça". Os sacrifícios realizados na antiguidade simbolizavam a fé no futuro Messias, Jesus (Hebreus 9:9-12). O cerimonialismo ensinado por Deus na antiga aliança não visava expressar obras, mas fé no perdão que se consolidou através de Cristo, na cruz do Calvário.

"Debaixo da lei"
Paulo nunca excluiu a lei da vida do cristão (Romanos 3:31I Coríntios 7:18-19); nunca estabeleceu conflito algum entre lei e graça; nunca ensinou duas maneiras de alcançar a salvação. A sua afirmativa: "não estais debaixo da lei[e], e sim da graça" (Romanos 6:14 RA), declara que o pecador arrependido, ao abandonar a sua conduta pecaminosa, não está sujeito a condenação por ter transgredido a lei de Deus (cf. Romanos 7:5-12), pois a graça concedeu-lhe o perdão (cf. Ezequiel 33:12-16Miquéias 7:18-20Hebreus 8:10-12).

Paulo exortou os cristãos romanos a não retornarem às suas antigas atitudes de pecado, pois, agindo desta maneira, preservariam o respeito pela lei de Deus e evitariam que o mal dominasse novamente suas vidas; eles não seriam como antes, escravos do pecado (Romanos 6:11-23Romanos 7:14-25). O verso de Romanos 6:14 apresenta o seguinte ensino: "Tendo abandonado os vossos pecados, tendo cessado de quebrar a lei, tendo crido em Cristo e sendo batizados, vós agora não sois mais governados pelo mal ou pelas paixões carnais; não sois condenados pela lei, porque achastes graça à vista de Deus, que vos concedeu este favor imerecido, e os vossos pecados foram perdoados." - E somente uma vida guiada pelo Espírito Santo é capaz de obedecer a lei de Deus.8

Quando o pecador aceita a salvação concedida pela graça, ele passa por uma conversão; há uma mudança do "velho" para o "novo" homem, do pecado para a santidade, da condenação para absolvição (Romanos 6:1-7). Todavia, se ele anular o perdão que lhe foi concedido, praticando novamente as más obras, a lei com toda a sua autoridade (firme e implacável), se fará atuante e apontará o seu respectivo pecado; ele estará mais uma vez "debaixo da lei". Ela exercerá novamente o seu direito de cobrar justiça e a devida punição: a morte eterna. E caso o pecador escolha sair desta condição, ele terá que recorrer novamente a graça para obter mais uma vez o perdão.

Pecaremos ou transgrediremos os mandamentos de Deus porque não estamos "debaixo da lei" (sob sua condenação) mas "debaixo da graça" (ao abrigo do perdão divino)? De modo nenhum (Romanos 6:15). Portanto, a própria conclusão de Paulo aniquila inteiramente a teoria de um suposto conflito entre a lei e a graça, ou, de que a graça anulou a lei. A ideia de se estar "livre da lei" (livre de obedecê-la) não é nova, este vil pensamento surgiu pela primeira vez, por volta de 608 a.C., nos tempos do profeta Jeremias. Naquela época esse argumento indigno foi apresentado pelo rebelde povo de Judá a fim de "justificar" os seus pecados:
"Mas vejam! Vocês confiam em palavras enganosas e inúteis. Vocês pensam que podem roubar e matar, cometer adultério e jurar falsamente, queimar incenso a Baal e seguir outros deuses que vocês não conheceram, e depois vir e permanecer perante Mim neste templo, que leva o Meu nome, e dizer: 'Estamos seguros!' Seguros para continuar com todas essas práticas repugnantes?" (Jeremias 7:8-10 NVI).
Atitude semelhante existe entre os professos cristãos da atualidade. É comum ouvir "não estamos debaixo da lei, e sim da graça", unicamente na tentativa de justificar a desobediência ao quarto mandamento. Ninguém a utiliza como pretexto para descumprir os demais preceitos de Deus. Acredita-se que aqueles que usam esse argumento para fugir da guarda do sábado, não sentem nenhum desejo de blasfemar, roubar, matar, adulterar e etc., certamente que estas coisas lhes causam horror. Contudo, com tal atitude, apenas provam que não é a lei de Deus que os inibe de cometer tais transgressões, mas a educação que receberam; a vigilância social e a opinião pública. Se a prática desses horríveis pecados fossem aceitos na sociedade, então não hesitariam em dizer que praticam tais coisas porque "não estão debaixo da lei, e sim da graça", usariam o mesmo argumento registrado em Jeremias 7:10.

Outra questão inegável, os que pisam deliberadamente o quarto mandamento dizendo que não estão "debaixo da lei", creem que não devem insultar o nome de Deus, desonrar pai e mãe, idolatrar, furtar; enfim, evitam estas e outras práticas hediondas. Em outras palavras, "obedecem" parcialmente a lei de Deus apenas por formalismo social e agem de maneira contraditória, pois, segundo a teoria que defendem, estão certamente "debaixo da lei" pelo fato de "guardarem" nove dos Dez Mandamentos.


Vídeos relacionados: A Lei e a GraçaCremos na Graça
Texto baseado em: CHRISTIANINI, A. B. (1981). Subtilezas do Erro, 2.ª ed., São Paulo: CPB, p. 93-96.
a. Prática da igreja romana, na idade média, que consistia em conceder perdão parcial ou total de pecados; ocorrendo casos em que este perdão era vendido e o comprador recebia um documento "garantindo" a quitação de sua(s) transgressão(ões). Alguns desses documentos continham prazo de validade.
d. Acesse: Finda-se o Tempo
e. A expressão "debaixo da lei" também é usada nos seguintes versos: "[...] Para os que estão debaixo da lei, tornei-me como se estivesse sujeito à lei (embora eu mesmo não esteja debaixo da lei), a fim de ganhar os que estão debaixo da lei." (I Coríntios 9:20 NVI); "Mas, quando chegou a plenitude do tempo, Deus enviou Seu Filho, nascido de mulher, nascido debaixo da lei, a fim de redimir os que estavam sob a lei, para que recebêssemos a adoção de filhos." (Gálatas 4:4-5 NVI). Nos dois casos a expressão "debaixo da lei" não é aplicada com o mesmo significado de Romanos 6:14-15. Enquanto Paulo em Romanos 6:14-15 utiliza esta expressão para comparar duas condições distintas na vida do homem, aquela dominada pelo pecado e consequentemente sob a condenação da lei (debaixo da lei) e aquela livre do comportamento pecaminoso e consequentemente sob o perdão de Deus (debaixo da graça), em I Coríntios 9:20 e Gálatas 4:4-5 ele utiliza a expressão "debaixo da lei" para indicar a condição de submissão (obediência) integral da lei de Moisés. Em Gálatas 4:4, Paulo refere-se a condição de nascimento de Jesus, que foi sob a jurisdição da lei mosaica. E Ele cumpriu todas as exigências desta lei (Mateus 5:17-18 cf. Isaías 53:9). Igualmente, a afirmativa em Gálatas 4:5: "a fim de redimir os que estavam sob a lei", refere-se aos demais judeus que estavam submissos as peculiaridades cerimoniais da lei de Moisés (Gálatas 3:23-29 cf. II Coríntios 3:12-18), mas haviam sido libertos de tais coisas com o sacrifício de Jesus (Mateus 27:51 cf. Efésios 2:15). Portanto, o sentido contextual, o valor semântico da palavra "debaixo" (gr.hupo) em I Coríntios 9:10 e Gálatas 4:4-5 é completamente distinto de Romanos 6:14-15. Para maiores esclarecimentos sobre I Coríntios 9:10 acesse: Obediência por Interesse?
1. Ezequiel 18:20; I João 3:4; Romanos 6:23; Êxodo 32:33; Apocalipse 20:15.
2Signs of the Times, 19 de maio de 1898. In: WHITE, E. G. Cuidado de Deus, São Paulo: CPB, p. 325; (Meditações Matinais, 1995).
3. WHITE, E. G. Desejado de Todas as Nações, O; São Paulo: CPB, sec. III, cap. 64, p. 587. Acesse:Misericórdia Infinita, Paciência Limitada.
4. STRONG, A. H. (1097). Systematic Theology, vol. II, Philadelphia: American Baptist Publication Society, chap. III, sec. III, p. 548-549; (Augustus Hopkins Strong foi presidente e professor de teologia bíblica no Seminário Teológico de Rochester, fundado pela universidade de Rochester).
5. Isaías 24:5-6; Romanos 5:12-13 cf. I Coríntios 15:56; Apocalipse 21:8.
6. Isaías 42:21; João 14:15-21; I João 3:21-24; I João 5:1-5.
7. Mateus 5:17-19; Lucas 16:17; Romanos 3:31; Apocalipse 11:19, Apocalipse 15:5 cf. Êxodo 25:8-16, Hebreus 9:1-5.
8. Romanos 7:14; Romanos 8:5-8 cf. João 14:21-26, Hebreus 10:15-17.


sábado, 17 de maio de 2014

O Decálogo no Éden - II

A descrença de que Adão e Eva tinham o pleno conhecimento da lei de Deus antes de transgredi-la, ocorre por desinformação ou por oposição intencional. Neste último caso, prevalece o intuito de combater a obediência universal exigida pela lei, pois, sendo ela transmitida desde o período do Éden, de imediato anula-se qualquer alegação de que teria sido entregue unicamente no monte Sinai e, destinada apenas para os israelitas(a).

Essa atitude mórbida de não suportar a onipresença da lei, além de acarretar cegueira espiritual, conduz os mais exaltados a confrontar abertamente o posicionamento oficial de suas respectivas igrejas, a saber: o ensino escriturístico da existência e vigência da lei de Deus (Dez Mandamentos) desde a fundação do mundo. Adiante a posição doutrinária de algumas delas.

Igreja Anglicana
"O pecado original não se detém ao lado de Adão (como os pelagianos(b) inutilmente dizem), porém ele é a culpa e corrupção da natureza de cada homem, que naturalmente procede da descendência de Adão; por meio dele o homem está muito longe da retidão original, e é de sua própria natureza inclinar-se para o mal, de modo que a carne sempre deseja contrariamente ao Espírito; (...) não está sujeita à lei de Deus."1

Igreja Assembleia de Deus
"O pecado atinge toda a raça humana, a partir de Adão e Eva (Gn 3Rm 5.12). (...) O pecado originou-se nas regiões celestiais quando o Diabo, querubim que servia na presença de Deus, encheu-se de arrogância e desejou usurpar o trono do Criador (Is 14.13,14). Por sua livre vontade escolheu o caminho do pecado, o que motivou sua destituição das suas funções celestiais, condenação, e execração eterna. (...) 'Todo pecado é transgressão da lei' (1 Jo 3.4). Transgredir significa infringir, violar, quebrar a lei, passar dos limites. Todo e qualquer mandamento divino deve ser obedecido, pois, desobedecê-lo significa transgredi-lo. (...) Adão, como representante da raça humana, também sucumbiu diante do pecado, sujeitando todos os seus descendentes aos aguilhões do mal moral; tornando-o, portanto, universal a todas criaturas racionais, e afetando até mesmo a criação."2
"Como resultado da queda o homem teve: 1) Conhecimento do mal. Antes da queda o homem era capaz de pecar, contudo, desconhecia os efeitos que isso provocaria. Ao desobedecer, ele adquiriu esse conhecimento do pecado, e por essa razão foi-lhe proibido comer do fruto dessa árvore do conhecimento do bem e do mal. Gn 3.222) A Perda da comunhão com Deus. Havendo quebrado à lei de Deus, o homem sentiu-se envergonhado na Sua presença. Essa vergonha destruiu a comunhão com Deus, causando grave prejuízo."3
"Os Dez Mandamentos foram pronunciados por Deus e escritos por Ele em duas tábuas de pedra, Êx 31.18. Foram escritos de ambas as bandas, Êx 32.15. Não se deve pensar que não existia nada destes mandamentos, antes de Moisés. Foram escritos nas mentes e nas consciências dos homens desde o princípio. Não há pecado que não é condenado por um dos Dez Mandamentos. A súmula do Decálogo é o dever para com Deus e o dever para com o próximo; melhor, é o amor para com Deus e o amor para com o próximo."4

Igreja Batista
"Acreditamos que o homem foi criado em santidade, subordinado à lei de seu Criador; mas por transgressão voluntária caiu desta condição santa e feliz. Por consequência todos os homens são agora pecadores, não por coação, mas por escolha; sendo por natureza completamente destituído da santidade exigida pela lei de Deus, inegavelmente inclinados para o mal e, portanto, sob justa condenação à ruína eterna, sem defesa ou desculpa."5
"A mesma lei que foi escrita no coração do homem, continuou a ser uma perfeita regra de justiça após a queda, e foi entregue por Deus no monte Sinai, em Dez Mandamentos escritos em duas tábuas, os quatros primeiros contendo nosso dever para com Deus, e os outros seis o nosso dever para com o homem."6
"Acredito que, a partir da mesma autoridade que Deus criou o homem à imagem de Seu próprio e glorioso caráter moral, um tema peculiar de Seu governo virtuoso, com disposições propriamente ajustadas à lei que ele estava subordinado e idêntica capacidade para obedecê-la ao máximo, contra todas as tentações em contrário, creio que, se Adão ou qualquer criatura santa, tivesse elaborado uma lei para si mesmo, ele teria feito uma precisamente como a lei de Deus; visto que seria uma enorme privação para um indivíduo santo, não ser permitido amar a Deus com todo o seu coração, com toda a sua alma e todo o seu entendimento."7

Igreja Congregacional
"Deus entregou a Adão uma lei, como um pacto de obras, pela qual Ele o submeteu e toda sua posteridade, a uma obediência perpétua, pessoal, completa e perfeita; prometeu vida sob a condição de cumprir e ameaçou de morte em caso de violar a mesma, e dotou-lhe com poder e capacidade para guardá-la. Essa lei, após sua queda, continuou a ser uma perfeita regra de justiça; e, como tal, foi entregue por Deus no monte Sinai, em Dez Mandamentos, escritos em duas tábuas: os primeiros quatro mandamentos contêm o nosso dever para com Deus; e os outros seis, o nosso dever para com o homem."8
"Aprendemos com este assunto o absurdo do antinomianismo(c). Duas doutrinas antinomianas proeminentes são: que a lei de Deus não é um regulamento de dever para os cristãos; e que as transgressões dela pelos cristãos não são pecados.
Pecado, diz S. João, é a transgressão da lei(d). É uma forte afirmação; nesse caso, uma declaração exigindo justificação na qual nenhum homem pode pleitear: que não há tal coisa, ou, que não existe este assunto de transgressão da lei, que não é pecado. Por qual razão não seriam pecaminosas as transgressões dos cristãos? Seriam eles seres santos? Adão era perfeitamente santo, até sua transgressão arruinar o mundo. Anjos eram perfeitamente santos, em um estado muito superior ao de Adão, mas suas transgressões os afastaram do Céu! Porque estariam os cristãos liberados?"9

Igreja Luterana
"Estas foram as razões, porque, na descrição do pecado original fizemos menção também da concupiscência. (...) o pecado original também contém estas enfermidades, a saber: ignorância de Deus, desprezo de Deus, caráter destituído de temor e confiança em Deus, incapacidade de amar a Deus. Estas são as principais falhas da natureza humana, conflitantes especialmente, com a primeira tábua do Decálogo."10
"O primeiro pecado do homem, ou queda, foi a transgressão da lei do Paraíso, na qual os nossos primeiros pais violaram uma interdição divina que proibia-lhes de comer o fruto da 'árvore do conhecimento do bem e do mal' (...). Nossos primeiros pais, na queda, violaram diretamente uma lei positiva, porém de forma indireta e praticamente, através da desobediência deles, quebraram do início ao fim as limitações de toda a lei Moral(e)."11
"O catecismo luterano, fornece a seguinte definição: 'Pecado original consiste em uma propensão para as coisas proibidas pela lei de Deus e uma aversão à Sua vontade'. Na apologia da confissão(f), encontramos a seguinte definição: 'Pecado original consiste na primeira ausência de santidade e justiça no paraíso'."12

Igreja Metodista
"(...) a lei Moral, constituída por Dez Mandamentos e ministrada pelos profetas, Ele [Jesus Cristo] não removeu. Não foi o objetivo de Sua vinda, revogar qualquer parte dela. Esta é uma lei que jamais pode ser inutilizada; que 'permanece firme como uma testemunha fiel no Céu'(g). (...) surgiu desde o princípio do mundo, sendo 'escrita não em tábuas de pedra', mas no coração de todos os filhos dos homens, quando saíram das mãos do Criador."13
"(...) Se examinarmos a lei de Deus, assim como igualmente entregue a Adão, ou a Moisés, nós a encontraremos perfeita e sem defeito, respeitada em si mesma. Pois em verdade, 'a lei é santa, e o mandamento é santo, justo e bom.'(h) Procedendo de Deus, a fonte de santidade, justiça e bondade, ela deve necessariamente possuir estes atributos. Pode, portanto, ser justamente chamada de 'transcrição de Sua natureza'."14
"(...) É verdade, Adão não tinha a lei escrita em tábuas de pedra; mas ela foi escrita em sua mente. Deusimprimiu-a em sua alma, lhe estabeleceu uma lei em si mesmo (...). Todas as suas paixões, na verdade, todos os seus interesses e sensíveis impulsos eram subordinados à sua razão e vontade, as quais estavam de acordo com a vontade de Deus. Eram completamente, por consequência, puros de toda profanação, livres de toda desordem ou imperfeição; pois todas as suas atitudes estavam devidamente submetidas a sua límpida razão e sua santa escolha. Ele tinha também uma faculdade ativa, responsável por seu desejo, uma capacidade para fazer o bem que ele sabia que deveria ser feito, e se dispusera a fazer; exatamente para cumprir toda a lei de Deus. Se não fosse assim, Deus não teria requerido a perfeita obediência dele."15

Igreja Presbiteriana
A "The Westminster Confession of Faith"16 (confissão de fé adotada pela igreja Presbiteriana), defende integralmente a mesma doutrina apresentada pela "The Savoy Declaration of Faith and Order" em seus artigos I e II do capítulo XIX. Desde modo, para evitar redundância deste conteúdo, releia acima (caso haja necessidade) a citação de número 8, da igreja Congregacional.
O catecismo da igreja Presbiteriana nos Estados Unidos, após revisão e aprovação feita pela Assembleia Geral (ocorrida em maio de 1829, na cidade de Princeton, Kentucky), expõem:
Pergunta: O que é pecado?
Resposta: Pecado é qualquer falta de concordância ou transgressão da lei de Deus.
Pergunta: Qual foi o pecado pelo qual nossos primeiros pais caíram do estado em que foram criados?
Resposta: O pecado pelo qual nossos primeiros pais caíram do estado em que foram criados, foi a cobiça de comer o fruto proibido.
(...)
Pergunta: Qual é o dever que Deus exige do homem?
Resposta: O dever que Deus exige do homem, é a obediência à Sua vontade revelada.
Pergunta: O que Deus em primeiro lugar revelou ao homem como regra de sua obediência?
Resposta: A regra que Deus revelou primeiramente ao homem para sua obediência, foi a lei Moral.
Pergunta: Onde está a lei Moral resumidamente compreendida?
Resposta: A lei Moral está resumidamente compreendida nos Dez Mandamentos.17
"A confissão de fé, adotada tanto pela Antiga e Nova Escolas Presbiterianas, afirmam que 'todo pecado, tanto original e atual, sendo uma transgressão da justa lei de Deus e contrária a esta, produz em sua própria natureza a culpa sobre o pecador, por ele [pecado] está destinado à ira de Deus'."18

Igrejas Reformadas
"Por pecado entendemos a corrupção inata do homem que tem sido derivada ou propagada em todos nós a partir de nossos primeiros pais (...) Repletos de toda a maldade, desconfiança, menosprezo e ódio a Deus, somos incapazes de fazer ou até mesmo pensar algo bom por nós mesmos. Ademais, mesmo ao envelhecermos, através de maus pensamentos, palavras e atos praticados contra a lei de Deus, produzimos publicamente frutos corruptos digno de uma árvore do mal (Mateus 12:33 ss)."19


b. Adeptos do pelagianismo. Esta doutrina ensina que: o homem, em essência, possui uma natureza bondosa; a fragilidade humana não é fator de atos pecaminosos; o pecado de Adão não afeta seus descendentes; o homem é completamente responsável por sua própria salvação; e, que a graça divina apenas auxilia na santificação.
c. Movimento ideológico que vale-se da graça divina para defender a abolição de regras ou preceitos da lei; filosofia que confronta os padrões de conduta determinados pela lei de Deus; que desvia-se da lei divina.
d. Citando I João 3:4 (cf. Romanos 4:15; Romanos 7:7).
f. Apologia da Confissão de Augsburgo (The Apology of the Augsburg Confession).
g. Em referência a Salmos 119:89 (cf. Êxodo 34:28, Apocalipse 11:19).
h. Citando Romanos 7:12.
1The Book of Common Prayer: The Sacraments, Rites and Ceremonies of the Church. (1853). New York: Printed by Appleton & Company, art. IX, p. 540.
2Lições Bíblicas: Jovens e Adultos, Rio de Janeiro: CPAD, 4.º trimestre de 2006, lição 08 (O Pecado, a Transgressão da Lei Divina).
3. OLSON, N. L. (1994). O Plano Divino Através dos Séculos, 14.ª ed., Rio de Janeiro: CPAD, p. 25.
4. BOYER, O. S. (1966). Pequena Enciclopédia Bíblica, 1.ª ed., Rio de Janeiro: CPAD, p. 237; (verbete: "Dez Mandamentos").
5The New Hampshire Confession of Faith (1833), chap. III (Of the Fall of Man).
6The 1677/89 London Baptist Confession of Faith, chap. XIX, art. II.
7. MANLY, B. (1856). The American Baptist Memorial: a Statistical, Biographical and History Magazine, vol. XV, Richmond, Virginia: Printed by H. K. Ellyson, art. IV, p. 346; (transcrita de "Andrew Fuller's Confession of Faith". Esta obra foi entregue em 07 de outubro de 1783 pelo teólogo e ministro batista Andrew Fuller que, na ocasião, era pastor da Primeira Igreja Batista em Kettering, Northamptonshire).
8The Savoy Declaration of Faith and Order (1658), chap. XIX, art. I, II.
9. DWIGHT, T. (1823). Theology Explained and Defended, vol. III, 3th ed., New-Haven: Printed by S. Converse, ser. XCI, p. 59-60.
10The Apology of the Augsburg Confession, chap. I, art. II (Of Original Sin). In: JACOBS, H. E. (1911). The Book of Concord: The Symbolical Books on the Evangelical Lutheran Church, Philadelphia: The United Lutheran Press, p. 78.
11. KRAUTH, C. P. (1872). The Conservative Reformation and its Theology: As Represented in the Augsburg Confesssion, and in the History and Literature of the Evangelical Lutheran Church, Philadelphia: Printed by J. B. Lippincott & Co., art. IX (Original Sin), p. 377.
12. LOCHMAN, J. G. (1818). The History, Doctrine and Discipline of the Evangelical Lutheran Church, Harrisburgh: Printed by John Wyeth, art. II, p. 87.
13. DREW, S. (1829). Sermons on Several Occasions by the Rev. John Wesley, vol. I, London: Printed by Thomas Tegg, ser. XXVII, disc. V, p. 276-277.
14. SMITHSON, W. T. (1859). The Methodist Pulpit South, 3th ed., Washington, D.C.: Printed by Henry Polkinhorn, p. 164-165; ("The Perfect Law of Liberty").
15. WESLEY, J. (1828). The Miscellaneous Works of the Rev. John Wesley, vol. II, New York: Printed by J. Harper, part. VII (The Doctrine of Original sin), p. 353.
16The Westminster Confession of Faith (1647), chapter XIX, art. I, II.
17The Constitution of the Cumberland Presbyterian Church in the United States of America. (1843). Pittsburgh: Printed by Arthur A. Anderson, p. 83, 87-88.
18. PARK, E. A.; TAYLOR, S. H. (1863). Bibliotheca Sacra and Biblical Repository, vol. XX, London: Printed by Thübner & Co., art. III, p. 579.
19The Second Helvetic Confession, chap. VIII: Of Man's Fall, Sin and the Cause of Sin; (esta confissão de fé foi escrita em 1562 por Heinrich Bullinger, sendo publicada posteriormente na cidade de Zurique em 1566 por Frederico III da Palatina e, adotada também pelas igrejas Reformadas da Suíça, França, Holanda, Escócia, Hungria, Polônia e Inglaterra).


sábado, 10 de maio de 2014

O Decálogo no Éden

Muitos acreditam que os Dez Mandamentos surgiram quando Moisés os recebeu no monte Sinai, sendo até então desconhecidos. Outros creem que eles foram destinados aos judeus e não precisam ser obedecidos pelos gentios. E um terceiro engano afirma que Jesus os substituiu por "dois novos" mandamentos. Estas noções absurdas contrariam fortemente os ensinos da Bíblia, e Deus aniquila pessoalmente a primeira ilusão citada ao declarar:
"Porque Eu o escolhi para que ordene a seus filhos e a sua casa depois dele, a fim de que guardem o caminho do Senhor e pratiquem a justiça e o juízo. [...] Na tua descendência serão abençoadas todas as nações da Terra; porque Abraão obedeceu à Minha palavra e guardou os Meus mandados, os Meus preceitos, os Meus estatutos e as Minhas leis." (Gênesis 18:19 RAGênesis 26:4-5 RA).

Estes versos afirmam que Abraão seguiu e foi escolhido para ensinar a conduta de vida estabelecida por Deus. Mas antes deste testemunho, Deus tinha feito a ele a seguinte recomendação: "[...] guarde a Minha aliança, tanto você como os seus futuros descendentes." (Gênesis 17:9 NVI). Neste ponto, surgi a pergunta: Os descendentes de Abraão foram igualmente zelosos com a aliança instituída por Deus, obedecendo aos Seus preceitos, estatutos e leis? Vejamos:
"Então, disse o Senhor a Moisés: Eis que vos farei chover do céu pão, e o povo sairá e colherá diariamente a porção para cada dia, para que Eu ponha à prova se anda na Minha lei ou não.
Dar-se-á que, ao sexto dia, prepararão o que colherem; e será o dobro do que colhem cada dia. [...] Seis dias o colhereis, mas o sétimo dia é o sábado; nele, não haverá.
Ao sétimo dia, saíram alguns do povo para o colher, porém não o acharam. Então, disse o Senhor a Moisés: 'Até quando recusareis guardar os Meus mandamentos e as Minhas leis?'" (Êxodo capítulo 16RA).
Isso ocorreu no deserto de Sim, antes que os descendentes de Abraão chegassem ao deserto do Sinai, onde receberam os Dez Mandamentos na sua forma escrita (em duas tábuas de pedra) após firmarem com o Senhor o pacto de aliança (Êxodo 16:1Êxodo 19:1-8). Sendo assim, como poderia Deus pôr os israelitas à prova em relação ao sábado do quarto mandamento, se eles ainda iriam recebê-lo no monte Sinai? E por que os reprovou questionando: "Até quando recusareis guardar os Meus mandamentos e as Minhas leis?" (Êxodo 16:28).

O uso da locução adverbial "até quando", que provém do hebraico "'anah"(a), e o uso dos substantivos "mandamentos" e "leis", que são respectivamente traduções do hebraico "mitsvah"(b) e "towrah"(c), demonstram que os israelitas conheciam tanto a observância sabática quanto outras instruções divinas, e vinham a muito tempo negligenciando-as. Deus jamais teria testado-os naquela ocasião se eles não conhecessem os Seus preceitos, isso seria injusto. Através de Abraão eles receberam as orientações divinas transmitidas desde a época de Adão.

A lei de Deus no Éden
Adão e Eva transgrediram no Éden os princípios da lei de Deus quando cederam aos sofismas de Satanás, eles conscientemente desprezaram a justiça que lhes foi ensinada. Nesta infeliz atitude, eles escolheram seguir uma criatura e consideraram as palavras do Deus Criador falsas; desonraram Aquele que lhes concedera a vida; cobiçaram e furtaram; sentenciaram à morte gerações, pois ao perderem o direito à vida eterna tal condição foi repassada aos seus descendentes; e, se estes fatos ocorreram no sétimo dia da semana, pode-se afirmar ainda que tais transgressões ofenderam a Deus no Seu santo sábado.

Antes desse fatídico dia, Adão e Eva não conheciam os resultados do pecado: "eis que o homem se tornou como um de nós conhecedor do bem e do mal [...]" (Gênesis 3:22 RA cf. Romanos 7:7). Eles viviam em perfeita harmonia com Deus e, dia-a-dia, aprendiam sobre o Seu amor sintetizado em Sua lei (cf. Romanos 13:10). A respeito dessas transgressões a Bíblia revela:
"Portanto, assim como por um só homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado, a morte, assim também a morte passou a todos os homens, porque todos pecaram. Porque até ao regime da lei havia pecado no mundo, mas o pecado não é levado em conta quando não há lei. Todo aquele que pratica o pecado também transgride a lei, porque o pecado é a transgressão da lei. [E] o salário do pecado é a morte." (Romanos 5:12-13 RAI João 3:4 RARomanos 6:23 RA).
"Adão e Eva persuadiram-se de que seria questão insignificante o comer do fruto proibido, e que tal ato não poderia resultar em terríveis consequências como as de que Deus os avisara. Mas essa questão insignificante constituía uma transgressão da imutável e santa lei divina, e separou o homem de Deus, abrindo os diques da morte e trazendo sobre o mundo misérias indizíveis. Século após século tem subido da Terra um contínuo grito de lamento, e toda criação geme aflita, em resultado da desobediência do homem. O próprio Céu sentiu os efeitos da rebelião de Satanás contra Deus. O Calvário aí está como um monumento do estupendo sacrifício exigido para expiar a transgressão da lei divina. Não podemos considerar o pecado coisa trivial."1

"Depois da desobediência, Adão e Eva a princípio imaginaram-se ter obtido uma condição mais elevada de existência. Mas logo o pensamento de seus pecados os encheram de terror. Desapareceram o amor e a paz que haviam desfrutado, e em seu lugar experimentavam uma intuição de pecado, um terror pelo futuro. A veste de luz que os rodeara, desapareceu; e para suprir sua falta procuraram fazer para si uma cobertura, pois enquanto estivessem nus, não podiam enfrentar o olhar de Deus e dos santos anjos. Mas a nudez era mais do que física, era também uma nudez de alma."2

Outros exemplos bíblicos demonstram a existência da lei de Deus (Decálogo) antes de ser entregue no monte Sinai, tais como: o assassinato de Abel (Gênesis 4:8); promiscuidade e idolatria de vários povos da antiguidade, como de Sodoma e Gomorra (Gênesis 18:20Gênesis 19:4-5 cf. Romanos 1:18-32); Abrão antes de se tornar Abraão ocultou o seu real parentesco com Sara (Gênesis 12:10-20); José resistiu ao pecado de adultério (Gênesis 39:7-23); enfim, estes atos não poderiam ser classificados e condenados como pecaminosos se a lei de Deus não existisse anteriormente para denunciá-los (I João 3:4Romanos 4:15), pois "o pecado não é levado em conta quando não existe lei." (Romanos 5:13 NVI). "[...] De fato, eu não saberia o que é pecado, a não ser por meio da Lei. Pois, na realidade, eu não saberia o que é cobiça, se a Lei não dissesse: 'Não cobiçarás'." (Romanos 7:7 NVI). Sem a lei, por exemplo, Sodoma e Gomorra teriam sido injustamente condenadas a destruição (II Pedro 2:6 cf. Romanos 1:18).

A lei sob ataque no Céu
Lúcifer quando cobiçou o trono de Deus, ele transgrediu o princípio do décimo mandamento, e tal atitude levou-o posteriormente a violar os demais preceitos da lei.3 E aquilo que ele não conseguiu no Céu(d), esforça-se a todo custo para obter na Terra: adoração e domínio absolutos. Para isso ele utiliza o mesmo artifício, tornar a lei desprezível(e); e entende perfeitamente que para atingir este objetivo não há necessidade de proporcionar a transgressão de cada um dos Dez Mandamentos:
"Pois qualquer que guarda toda a lei, mas tropeça em um só ponto, se torna culpado de todos. Porquanto, Aquele que disse: 'Não adulterarás', também ordenou: 'Não matarás'. Ora, se não adulteras, porém matas, vens a ser transgressor da lei. Falai de tal maneira e de tal maneira procedei como aqueles que hão de ser julgados pela lei da liberdade." (Tiago 2:10-12 RA cf. I João 2:1-4).
As Escrituras não favorecem ideologias contrárias à lei de Deus, agir contra ela é auxiliar Satanás em seus propósitos. E eis os "motivos" que o conduz a combatê-la:
Deus é amor (I João 4:8), a base da lei é o amor (Romanos 13:8-10Mateus 22:37-40).
Deus é santo, justo e bom (Salmos 99:5Marcos 10:18Salmos 7:11), Sua lei é santa, justa e boa (Romanos 7:12).
Deus é eterno (I Timóteo 1:17), Sua lei é eterna (Lucas 16:17 cf. Isaías 24:5-6).
Deus é imutável (Tiago 1:17 cf. Malaquias 3:6), Sua lei é imutável (Mateus 5:17-19).
Deus é a verdade (João 14:6Salmos 31:5), Sua lei é a verdade (Salmos 119:142).
Alinhadas acima características inerentes a Deus e atribuídas também a Sua lei, visto que: os seus mandamentos descrevem o próprio caráter do Legislador e revelam o zelo dEle por Suas criaturas. A lei é a base do governo de Deus e, por seu intermédio, haverá o devido julgamento da humanidade(f). Não é de admirar o colossal esforço de Satanás para ocultá-la da mente do homem.4

Fundamentos do Decálogo
"Amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma e de todo o teu entendimento. Este é o grande e primeiro mandamento. O segundo, semelhante a este, é: amarás o teu próximo como a ti mesmo. Destes dois mandamentos dependem toda a lei e os profetas." (Mateus 22:37-40 RAMarcos 12:30:31).
Através de falsas interpretações destes versos, existe o esforço em substituir o Decálogo pelos dois mandamentos citados por Jesus. Porém, sem dificuldade alguma, percebe-se a leviandade nesta tentativa uma vez que os versos de Mateus 22:37-40 são na realidade a resposta para a pergunta: "Mestre, qual é o grande mandamento na lei?"(g) (Mateus 22:36 RA). Neste questionamento não se faz qualquer alusão sobre a substituição da lei, tanto a pergunta quanto a resposta estão envolvidas em destacar o mandamento de maior importância pertencente à ela.

Na expectativa de constranger Jesus, os fariseus interrogaram-No a respeito dos mandamentos contidos na lei mosaica e esperavam que Ele indicasse algum que não satisfizesse a pergunta. Mas, se decepcionaram ao receberem como resposta os dois mandamentos que retêm os princípios bases de toda a lei: amor a Deus, e amor ao próximo. A lei mosaica em sua totalidade esta alicerçada sobre estes fundamentos e Jesus simplesmente assinala o que já era ensinado pela própria lei: "Amarás, pois, o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma e de toda a tua força. [...] amarás o teu próximo como a ti mesmo." (Deuteronômio 6:5Levítico 19:18 RA). Ao contrário do que muitos imaginam, a resposta de Jesus não era algo novo ou exclusivo do Novo Testamento, como se pode observar nestes versos(h). E João chama atenção para isso ao dizer: "[...] peço-te, não como se escrevesse mandamento novo, senão o que tivemos desde o princípio: que nos amemos uns aos outros." (II João 1:5).

O apóstolo Paulo também refere-se a estes alicerces ou fundamentos da lei: "[...] não adulterarás, não matarás, não furtarás, não cobiçarás, e, se há qualquer outro mandamento, tudo nesta palavra se resume: amarás o teu próximo como a ti mesmo. O amor não pratica o mal contra o próximo; de sorte que o cumprimento da lei é o amor." (Romanos 13:9-10 RA). Nota-se ainda que Paulo exemplifica este assunto citando exclusivamente os mandamentos do Decálogo, os quais além de estarem fundamentados no princípio do amor, são a base da lei mosaica(i). O amor a Deus sempre estará sintetizado na obediência aos quatro primeiros mandamentos do Decálogo, assim como o amor ao próximo desenvolverá a dedicação aos seis últimos.

Considerações Finais
A Bíblia revela claramente a existência da lei de Deus (Decálogo) antes da criação do homem e, consequentemente, antes de Moisés. Ela foi estabelecida na Terra para toda a humanidade (Eclesiastes 12:13cf. Mateus 19:17-19). Os descendentes de Abraão, quando foram convocados por Deus para levarem os Seus ensinos às demais nações (Êxodo 19:5-6Isaías 51:4Romanos 3:2), já tinham o conhecimento desta lei antes de ser entregue na sua forma escrita no monte Sinai.

Deus não é um Criador e Governador de improviso, que realiza Seus propósitos sem planejamento. Ele não elabora regras conforme o surgimento das circunstâncias. E tais afirmativas são confirmadas pelas seguintes declarações: "Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo!", "[...] Cordeiro que foi morto desde a fundação do mundo" (João 1:29 RAApocalipse 13:8 RA). Este sacrifício único e derradeiro foi providenciado justamente pelos pecados do homem, pecados que segundo os ensinos escriturísticos são ocasionados pela desobediência aos princípios do Decálogo.5

O plano de salvação foi minuciosamente articulado antes da criação. Deus tinha conhecimento das transgressões que o homem causaria à Sua lei influenciado por Satanás (cf. Apocalipse 12:17João 8:44). O "fruto" de uma árvore, obviamente, não foi a causa do grande conflito em que a humanidade se envolveu. As implicações registradas em Gênesis capítulo 3 vão muito além disso.


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a'Anah relativo a tempo significa: quando?, quanto tempo?, até quando?
bMitsvah significa: mandamento, preceito, regra; coletivamente formam uma lei.
cTowrah significa: instrução; orientação; conjunto de ensinos proféticos; lei deuteronômica ou mosaica; leis específicas, códigos específicos, por exemplo: lei de ofertas queimadas e o Decálogo.
d. Acesse: A Origem do Mal
g. A palavra "lei" em Mateus 22:36 origina-se do grego "nomos", e no contexto da questão refere-se a lei de Moisés, ao conjunto de mandamentos da Torah.
h. A crença de que o preceito, "amarás o teu próximo como a ti mesmo", originou-se com o Novo Testamento, ocorre pelo desconhecimento de Levítico 19:18, e pela interpretação equivocada das seguintes palavras de Jesus: "Novo mandamento vos dou: que vos ameis uns aos outros; assim como Eu vos amei [...]" (João 13:34 RA). Jesus não afirmou que este preceito era "novo" no sentido de "inédito" ou "recém estabelecido", mas, que era novo para aqueles que o ouviram na ocasião, pois eles desconheciam o mandamento anunciado. No idioma grego, a palavra "novo", pode ser escrita de duas formas: "neos" (quando algo é novo no sentido de: tempo recente; jovem; recém originado; que surgiu a pouco tempo), e "kainos" (quando algo é novo no sentido de: antes desconhecido; incomum; anteriormente ignorado; recém revelado). E João 13:34 utiliza a palavra "kainos", identificando que o mandamento já existia, porém, era desconhecido para os ouvintes de Jesus. Outros exemplos que utilizam o adjetivo "kainos": "Todos se admiraram, a ponto de perguntarem entre si: 'Que vem a ser isto? Uma nova [kainos] doutrina!' [...]" (Marcos 1:27 RA); "Estes sinais hão de acompanhar aqueles que crêem: em Meu nome, expelirão demônios; falarão novas [kainos] línguas." (Marcos 16:17 RA).
i. Acesse: Lei de Deus & Lei de Moisés (em: Preceitos temporários e perpétuos).
1. WHITE, E. G. Caminho a Cristo, São Paulo: CPB, cap. 3, p. 33.
2. WHITE, E. G. Patriarcas e Profetas, São Paulo: CPB, sec. I, cap. 3, p. 57.
3. Isaías 14:12-14; Ezequiel 28:12-17 cf. João 8:44; Apocalipse 12:7-12.
4. Hebreus 8:10-12; Hebreus 10:15-17 cf. Jeremias 31:33-34; Isaías 8:16.
5. Hebreus 10:12-13; I João 3:4; Romanos 4:15; Romanos 7:7.